Amor & Revolução: Muita Repercussão para Pouca Audiência


por Fábio Mendes

Não fosse o Massacre de Realengo e a estreia do filme Rio, certamente o assunto principal da última semana seria a nova novela do SBT, Amor e Revolução, iniciada na última terça-feira na faixa "pós-novela-das-9" da emissora de Silvio Santos. Segunda trama assinada por Tiago Santiago na emissora e a primeira com enredo 100% original do autor após a famosa trilogia Os Mutantes (Rede Record), a novela foi um dos assuntos mais comentados da última semana nas redes de relacionamento e chegou a ter repercussão no Congresso Nacional e na Imprensa Internacional, como no jornal argentino Clarín. Uma petição de um site militar endereçada ao Ministério Público Federal, inclusive, já pede que a novela seja retirada do ar, evocando a Lei da Anistia.

Curiosamente, no entanto, os seus índices de audiência não estão ainda correspondendo a tamanha repercussão. Com uma tímida média de 7 pontos em seus primeiros quatro capítulos (números apenas levemente superiores à reprise de A História de Ana Raio e Zé Trovão, sua antecessora), a novela chegou a empatar com a Rede Bandeirantes na última quinta-feira. Rejeição essa que não teve reação, ao menos nesses primeiros quatro dias de exibição, e que certamente não se pode justificar por baixa divulgação.


A falta de interesse do público que realmente justifica tamanho investimento do SBT - o que assiste a novela e dá audiência - pode facilmente se explicar ao se assistir um trecho do material que já foi ao ar. Mesmo sendo a sua sétima trama como autor titular (antes de seu primeiro trabalho, o remake produzido pela Record de A Escrava Isaura, Santiago trabalhou como colaborador na Rede Globo por cerca de 15 anos, co-escrevendo tramas como Vamp, Uga Uga e Kubanacan), Tiago Santiago ainda demonstra pouca maturidade para apresentar a sua narrativa e seus personagens ao público.

No seu atropelado primeiro capítulo - em que insistentes cartelas com datas, anunciando passagem de tempo, apareciam de dois em dois miniutos - , pouco (ou nenhum) tempo foi reservado a apresentar os personagens que deveriam gerar empatia no público: em vez disso, longos e cansativos textos que mais pareciam transcrições mal-adaptadas de livros de história. O didatismo narrativo, já marca registrada do autor e sempre presente em seus outros trabalhos, com o contexto histórico sendo martelado a todo momento, em cada frase e fala, foi potencializado a níveis que o público ocasional dificilmente suportaria.



Com isso, o competente elenco pouco pode fazer para chamar a atenção: um exemplo gritante é o modo rasteiro como o militante Carlos Fiel (Marcos Breda) surge em tela: logo em sua primeira cena, ele encontra suas duas filhas e sua mulher na rua, é perseguido por militares, preso e tem suas duas filhas sequestradas pelo militar Filinto Guerra (Nico Puig). Tudo em menos de três minutos. Na cena seguinte, o casal e a babá das filhas já estão amordaçados e sendo torturados - com direito ao unidimensional torturador explicar que Carlos levará "uma corrente bem forte, de dez ampéres".


A trilha sonora, embora bem escolhida, com canções de protesto da época, é mal-trabalhada e usada a todo momento, enfraquecendo o seu discurso. Já o trabalho de direção, excessivamente pasteurizado, pouco se esforça em dar mais energia e dinamismo a uma narrativa que, ao mesmo tempo exageradamente ágil, pouco confia na inteligência visual do público - chama atenção a quase ausência de imagens de arquivo, resumida a apenas um clipe de dez segundos do comício de João Goulart na Central do Brasil, sendo assistido numa televisão.

O desperdício do potencial que uma história nesse universo de repressão poderia ter numa novela chega a níveis vexaminosos ao se ver um dos depoimentos que fecham cada capítulo, de pessoas que sofreram e passaram pelos momentos que a novela tenta frustradamente representar. O nível de emoção e crueza de detalhes de cada depoimento é simplesmente amedrontador e tocante.


Amor e Revolução, maior investimento em dramaturgia do SBT nos últimos anos, ainda está em seu início e pode se recuperar (é a primeira novela "aberta" do SBT, ou seja, que não foi totalmente filmada antes de ser colocada no ar), passando por ajustes no enredo e apostando mais nos dramas ainda mal trabalhados dos personagens que apresenta. Mas precisa se apressar - a Rede Record, principal oponente da emissora no horário, estreia em menos de um mês Vidas em Jogo, decidida a recuperar os índices da sua malsucedida antecessora, Ribeirão do Tempo. Caso consiga, toda essa repercussão que a novela do SBT possui agora infelizmente se revelará um trabalho de marketing totalmente desperdiçado. E como disse Silvio Santos em seu programa dia desses: "Se ela novela não der certo, vai me quebrar mais que o Pan Americano".

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