TV Canção Nova: Exemplo para as TVs Públicas?

Sede da Emissora Católica, em Cachoeira Paulista/SP

por Fábio Mendes

É comum em várias partes da Europa que parte da manutenção das redes de televisão seja paga a partir de impostos vindos do bolso da própria população. A chamada taxa da televisão pública, cujo funcionamento e valor são diferenciados em cada país, geralmente é paga no ato da compra de um aparelho receptor de sinal de vídeo (que pode ser um televisor, um computador com acesso a internet ou até celulares) e depois é sustentado por mensalidades ou taxas anuais. Ideia instituída na Inglaterra, através da rede BBC, foi adotada de formas diversas em redes públicas por toda a Europa após a Segunda Guerra Mundial – lembrando que em grande parte desses países, as primeiras redes de televisão surgiram através do financiamento público, com as redes privadas surgindo apenas décadas depois. De tal forma que a forma de relacionamento do povo europeu com a televisão, naturalmente, se afasta da praticada no Brasil, por exemplo.

A natureza da televisão brasileira – um espectro eletromagnético público com concessões cedidas pelo governo a grandes empresas privadas – impede que um modelo de TV pública com a mesma força do europeu surja em nosso país. Experiências como a da TV Cultura de São Paulo, mantida por uma Fundação controlada pelo Governo do Estado, e a recentemente implantada e polemizada TV Brasil, geram discussões sobre até quanto o estado deve ter influência sobre essas emissoras – mas o principal neste texto não é divagar sobre esse assunto, e sim apresentar uma bem-sucedida experiência nacional, próxima à da televisão pública europeia, que se repete na TV Canção Nova, emissora de uma comunidade católica do interior de São Paulo.


Fundada em 1978 a partir de um grupo de oração paulista liderado pelo padre salesiano (hoje Monsenhor) Jonas Abib, a Comunidade Canção Nova, situada num sítio da cidade de Cachoeira Paulista, na região do Vale do Paraíba, é composta por religiosos e voluntários que trabalham dentro da proposta original de usar os meios de comunicação para difundir a sua doutrina, fundada dentro dos princípios do Movimento da Renovação Carismática Católica (RCC).

Após criar a estação Rádio Canção Nova em 1980, a comunidade enfim fundou a sua própria emissora de televisão em 8 de dezembro de 1989, sendo considerada a mais antiga emissora do segmento no país. Tornou-se rede, porém, apenas em 1997, ao adquirir uma afiliada no Sergipe e expandir seu sinal para a região nordeste do país. Desde então, cresceu sua área de cobertura, com atualmente seis geradoras pelo Brasil e uma em Fátima, Portugal – além de retransmissoras em mais de 500 cidades e estar disponível por TV por assinatura e Parabólica, podendo ter seu sinal captado via satélite em parte da Europa e da América.


O que diferencia a rede, porém, de outras emissoras do gênero religioso no Brasil (como as católicas Rede Vida, Século XXI e as evangélicas RIT, Novo Tempo, Gênesis, Boas Novas, Rede Super, entre outras), além do princípio de aproveitamento da televisão como meio de evangelização, é o seu método de manutenção. Talvez a Rede Canção Nova seja a única emissora de televisão brasileira que, em teoria, é sustentada totalmente por doações espontâneas, sem propagandas comerciais ou financiamentos privados.

O seu método de manutenção, intitulado Clube de Evangelização, foi criado a partir de método semelhante criado para sustentar a emissora de rádio da comunidade. A partir do chamado Clube do Ouvinte, adquiria fundos para pagar a licença de funcionamento e os seus equipamentos, além de ampliar a sua rede.

Já com a emissora de televisão criada, as bases para um Sistema de Comunicação foram estabelecidas e evoluíram nos anos seguintes, com a criação de sua própria editora de livros cristãos e gravadora fonográfica, com artsitas conhecidos dentro do filão da música e da literatura católica.


O crescimento do movimento da Renovação Carismática no início dos anos 2000 ainda abriu espaço ainda para que a emissora ampliasse sua influência, além do apoio de celebridades do meio católico, como o Padre Fábio de Melo, a atriz Myriam Rios e Gabriel Chalita, que hoje tem seus próprios programas semanais e ainda participam de eventos como os chamados “acampamentos de oração”, que ocorrem mensalmente na Sede da Comunidade em Cachoeira Paulista, em plena expansão.

Com isso, o sistema de contribuição através de doações pôde se consolidar, através de vários meios: desde a taxa mensal paga pelo seu público (que não é obrigatória e pode ser paga por boletos mensais ou débito automático) a doações maiores de simpatizantes com o movimento pelo país. Um modelo que, somado à seu próprio merchandising externo em livros, CDs e DVDs (de shows, palestras e pregações), gera uma receita mensal que vialibiliza a manutenção de todo o sistema. Ainda através de campanhas adicionais exibidas pela televisão, são criados também concursos e eventos extras para angariar fundos relacionados à expansão da comunidade e projetos futuros, abrindo grande espaço para a participação dos fiéis colaboradores.

O fundador, Jonas Abib

O projeto Canção Nova se baseia totalmente através de um modelo colaborativo para se manter, mostrando aqui um precendente curioso na televisão brasileira. Que é mantido, acima de tudo, pela crença de seus telespectadores em busca do crescimento espiritual. O que pode servir como exemplo para projetos futuros de televisão pelo país... Só é necessária uma motivação forte que arrebanhe um grande grupo de pessoas. O desejo de ter qualidade cultural com independência não deveria servir pra isso?

Mais informações sobre a Canção Nova podem ser encontradas no Portal da Comunidade, que inclusive possui o sinal em streaming do canal de televisão disponível para visualização ao vivo.

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