por Fábio Mendes
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Atração dramatúrgica defendida por um elenco de qualidade, temos em "O Brado Retumbante" (Rede Globo, terça a sexta 23h30; exibição entre os dias 17 e 27 de janeiro) o tipo de programa que costuma impressionar o grande público à primeira vista: um trabalho técnico de alta qualidade comandado pelo diretor Ricardo Waddington, que emula sua estética em formatos similares norte-americanos e que traz para o Brasil uma história elaborada de ficção política. Uma atração indubitavelmente incomum na televisão brasileira, que em dramaturgia costuma buscar o diálogo mais popular e menos reflexivo.
A dificuldade em apresentar uma atração neste estilo na TV aberta se reflete no próprio formato de exibição da série, escolhido pela Rede Globo: com episódios fechados e entitulados ("O Presidente Acidental" foi o nome do primeiro), ausência de abertura no padrão comum da emissora e uma unidade narrativa completa girando em torno do presidente protagonista Paulo Ventura (Domingos Montagner, de Cordel Encantado) sem tramas paralelas, é perceptível que o formaro de exibição no qual a produção foi pensada previa a exibição semanal e a unidade composta por uma temporada de oito episódios.
No entanto, o potencial baixo resultado que uma série deste porte poderia ter na grade habitual da emissora numa época mais competitiva do ano, levou a uma mudança estratégica: tal como já feito anteriormente com Som e Fúria e Cinquentinha, O Brado Retumbante foi anunciada pela emissora como minissérie - o que já anula quase por completo a possibilidade de uma continuidade posterior em temporadas - e o produto que levaria oito semanas para ir ao ar se esgota em apenas duas, exibidas num período menos acirrado do ano.
História passada em uma versão alternativa do próprio Brasil - mas em que a todo momento é evocada em comparações com o próprio país - temos uma história que tem como ponto de partida um incidente diplomático: evocando as histórias reais dos políticos Ulysses Guimarães (que já tentou a presidência) e Tancredo Neves, temos a morte súbita, em um acidente de helicóptero, do presidente Aurélio Montesanto e seu vice, rivais políticos do presidente da câmara Paulo Ventura. Como prevê a constituição, ele é obrigado a assumir a presidência, o que altera radicalmente sua vida e de todos à sua volta.
Tal como Marcelo Freixo, Paulo tem ampla empatia popular, uma imagem íntegra de honestidade, abraçada pela sua votação recorde para Deputado Federal, um blog bastante acessado na internet (que foi reproduzido pela produção da série em http://obradoretumbante.globo.com/platb/sonho-intenso/) e a chefia de uma CPI. No entanto, como João Goulart, ele não é levado a sério pelos próprios parceiros políticos, e, ao desencadear uma reação ferrenha da oposição e imimigos políticos, Paulo será levado aos próximos capítulos à toda sorte de situações difíceis que um presidente poderia passar: crises internas, exposição dos problemas familiares e pessoais, acusações de corrupção, uma possível campanha de reeleição e até um pedido de impeachment.
A situação política do Brasil "de verdade" é ironizada a todo momento, seja pela formulação dos personagens, a todo momento evocando "parentes políticos" reais e até críticas visuais e textuais a fatos recorrentes do governo verdadeiro do país - como o inteligente plano que apresenta os nomes de ministérios super-inflacionados pelo governo deixado por Montesanto.
Mesmo com todos esses elementos narrativos fascinantes e uma inteligente sinopse por trás, no entanto, O Brado Retumbante incomoda no que deveria ser uma de suas principais virtudes: o texto, escrito por Euclydes Marinho com Nelson Motta, Guilherme Fiúza e Denise Bandeira. Não que o conteúdo dos diálogos seja risível, pelo contrário. Mas o pesado conteúdo falha ao tentar ser transposto com naturalidade na tela.
Euclydes Marinho |
Isso se estende a diversos outros momentos, como um no início do episódio em que um personagem pede um cargo para um parente para um político corrupto ou quando Paulo Ventura presencia um acidente de moto e recebe uma proposta de suborno dos policiais. Uma das poucas exceções se encontram nos momentos íntimos entre Paulo e sua ex-mulher Antônia (Maria Fernanda Cândido em excelente momento) e seus filhos, apesar que o artificialismo persiste e chega a piorar nas cenas em que Paulo conversa com sua mãe Julieta, um fraquíssimo alívio cômico, defendido por Maria do Carmo Soares. "Que história é essa de você virar presidente da república?" remete até a tentativas de humor feitas por Tiago Santiago em sua novela Amor e Revolução, outra produção que falhou recentemente em adaptar de forma satisfatória um texto essencialmente político.
"O Brado Retumbante", numa primeira visita, em fim, frustra em ter seu Calcanhar de Aquiles exatamente no local onde deveria ser o seu ponto forte. Porém, por ser ainda apenas o piloto, ainda há a esperança de que o trabalho amadureça nos próximos episódios. Independendo da sua posição política, das suas qualidades e falhas, é um bom, raro e bem-vindo exercício de televisão. E vale ser prestigiado.
ACHEI SUPER INTERESSANTE ESSA MINISSÉRIE E TODO BRASILEIRO DEVE ASSISTIR. Domingos, o ator principal, está impecável. Apesar de seus defeitos, é uma raridade no meio político, o personagem Paulo Ventura.
ResponderExcluirEu gostei da narrativa. A série é boa.
ResponderExcluirMás o que me chamou muito a atenção, foi a qualidae técnica, onde foram usadas tomadas características de cinema. Vejam quando dois persosagens estão dialogando, normalmente se usam cortes na TV, más no cimema, se utiliza a variação de foco, o que fica muito bom.
Quanto a taxa de quadros, com certeza foi feita em 24fps progressivo e não em 29.97fps intrelaçado como de costume. Isto dá um ar cinematográfica para a fotografia.
A abertura, aparentemente simples, deu um certo trabhalho para fazer, o que, infelizmente só pode ser visto em full HD.
Espero que esta experiência se repita. Ficou ótimo.
Nota:9
Estou gostando da série, que reflete exatamente a situação política e podre de nosso país. Até parece que não é ficção. Todos os quadros remetem a casos verídicos, segundo temos visto na imprensa ao longo desses anos. Parabéns para o autor, pelo roteiro, pela coragem e pela qualidade técnica. Pena que a Globo esconda essa pérola para ser vista em um horário em que apenas os mais esclarecidos assistem (penso eu). Com a força da Globo, se a história dessa mini-série fosse levada para as novelas, acho que seria um bom estopim para fazer esse Brasil acordar !!
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