Embora apresente oscilações e até declínio nos índices de audiência, a TV aberta cresce ano a ano em receitas publicitárias, impulsionada pela situação econômica do Brasil.
[Publicada originalmente na Revista Tele Viva em março de 2012, por Ana Carolina Barbosa]
A relação desproporcional entre os índices de audiência da TV aberta, que vem apresentando nos últimos anos movimento descendente, e o faturamento das redes, que cresce ano a ano com projeções sempre otimistas, de expansão beirando os dois dígitos, é explicada basicamente pela situação econômica do País. No seu escritório na sede da Globo em São Paulo, Octávio Florisbal, diretor-geral, trata os números com serenidade, Para ele, o progresso econômico que o Brasil vem experimentando beneficia o negócio da televisão. “Se o Brasil fosse economia estabelecida, não teria crescimento de domicílios e de aparelhos por domicílio. O Brasil cresceu economicamente e isso nos ajudou a compensar a perda de audiência”, observa.
No hora de analisar a audiência, ele concentra-se na faixa das 7h às 24h, no período de 15 anos, fazendo uma análise da situação a partir de 1997, época de lançamente do Painel Nacional de Televisão (PNT), comparada com os últimos dados consolidados de 2011. Ele explica que, em 1997, o total de ligados por domicílio atingia cerca de 42 pontos. Destes, dois pontos eram de outros canais (TV paga) e um ponto era de outros aparelhos (DVD, videogame). A TV aberta ficava com 39 pontos. Passados quinze anos, o total de ligados na faixa horária analisada continua atingindo a média de 42 pontos, mas há mudanças importantes: com o crescimento da TV por assinatura no país, outros canais chegam a 6 pontos, outros aparelhos marcam 3 pontos e a TV aberta fica com 33.
No caso isolado da TV Globo, houve queda de 3 pontos em 15 anos. A emissora saiu dos 21 pontos de 1997 para 18 pontos em 2011. “Acreditamos que perdemos para outros canais e outros aparelhos”, sugere Florisbal, lembrando que, nesta análise, Record e SBT marcam juntas os mesmos 13 pontos de 15 anos atrás.
O que faz diferença tanto para a Globo quanto para as demais redes, explica o executivo, é a base maior. Em 97, eram 33 milhões de domicílios com TV no País; hoje, são 54 milhões. O número de aparelhos por domicílio também aumentou: hoje a média é de dois aparelhos de televisão. Mais precisamente, de acordo com o Ibope, em 1997 a média de aparelhos por domicílio era 1,72 e em 2012 saltou para 1,92. Diante deste conjunto de fatores, a entrega de audiência parte de uma base maior. Um programa que marcava 30 pontos em 1997, por exemplo, pois parte-se de uma base com mais espectadores.
Para o diretor geral da TV Globo, fazer crescer as receitas publicitárias é resultado da capacidade da rede de sincronizar investimentos em criação, produção, manutenção de talentos, compra de direitos, tecnologia e TI e a comercialização do tempo permitido por lei para a veiculação de comerciais, que é de 25% da programação. “Tem que fazer a melhor ocupação possível do estoque , um pricing muito bem sintonizado, condições comerciais adequadas de desconto. É toda uma sintonia fina para pagar toda a produção e deixar margem de lucro”, afirma.
Na coletiva de imprensa que concedeu no começo de março, na ocasião da apresentação da programação 2012 da emissora, o executivo afirmou que a Globo tem a meta de reconquistar os 19 pontos de audiência no horário das 7hs às 24hs, o que, segundo ele, já acontece de segunda a sexta, mas essa média não é mantida por causa dos fins de semana. Para a Globo, destaca Florisbal, “um ponto de audiência, assim como um ponto percentual no share publicitário, é muito importante”.
Números
Os números registrados pelo PNT do Ibope Media, que mede a audiência em domicílios equipados com aparelhos peoplemeter, apontam constância do meio televisão de uma forma geral nos últimos cinco anos. A média do total de ligados na medição em tempo integral mostrou pouca movimentação desde 2007. Naquele ano, o PNT registrava 15% no total de indivíduos. Em 2008, a televisão permaneceu nos mesmos 15%, evoluindo um ponto percentual em 2009 e voltando para os 15% em 2012 e 2011. Os índices por domicílio apresentam comportamento semelhante, variando de 34% em 2007 e 2008 para 35% em 2009 e voltando para 34% em 2011 e 2012. Vale lembrar que em pontos ligados estão incluídos outros canais e outros aparelhos.
Na avaliação de Dora Câmara, diretora comercial do Ibope Media, a audiência de TV tem apresentado comportamento estável nos últimos anos. “As pessoas continuam dedicando boa parte de seu tempo à TV”, observa. De fato, os índices de tempo médio do total de ligados apresentam escala crescente. Em 2007, o tempo médio no total de indivíduos era de 5h06. Em 2008, passou para 5h08, indo para 5h18 no ano seguinte e marcando 5h19 e 5h28 em 2012 e 2011, respectivamente.
Os investimentos publicitários no meio também apresentam evolução constante. Segundo levantamento do Ibope, o Ibope Monitor, que considera a ocupação de todo o espaço comercial utilizando o preço de tabela cheia do veículo, sem considerar descontos e negociações, a TV aberta e TV paga abocanharam juntas, entre janeiro e dezembro de 2011, 71% dos investimentos publicitários, sendo 53% concentrados na TV aberta, o que corresponde a R$ 46,3 bilhões. A evolução neste aspecto é bem mais notável. Em 2010, o total de investimentos em TV aberta foi de R$40,1 bilhões. No ano anterior, ficou em R$35,5 e, em 2008 e 2007 registrou, respectivamente, R$29,8 bilhões e R$25,7 bilhões. O Projeto Inter-Meios, que mede todo mês os investimentos reais em veiculação feitos pelos anunciantes na mídia brasileira, confirma a supremacia da TV aberta quando o assunto é investimento dos anunciantes em mídia. No período de janeiro a novembro de 2011, a TV aberta chegou à marca de R$16,2 bilhões, um crescimento de 8,8%.
Discurso sereno
Mesmo partindo de uma base menor que a TV Globo, as demais redes de televisão também demostram otimismo. O diretor comercial do SBT, Glen Valente acredita que há espaços a serem conquistados. “O nosso principal concorrente é muito eficiente, as outras são mais eficientes em alguns segmentos. Nós somos mais eficientes no domingo, com os nossos comunicadores”, avalia o executivo, destacando que o canal cresceu em audiência e em faturamento publicitário é manter a “consistência” da programação. Para ele, a qualidade e a estabilidade na grade são os fatores capazes de produzir reflexos no faturamento publicitário e na audiência. Como exemplo, ele cita o projeto de carnaval do canal, o “SBT Folia”, que entrou na grade no ano passado. Em 2011, o canal concentrou-se no carnaval de Salvador. Neste ano, em uma parceria com a Globo, ampliou a cobertura para os desfiles do grupo de acesso do Rio de Janeiro e de São Paulo. “Triplicamos a cobertura e dobramos o faturamento”, observa Valente. Segundo o executivo, a estimativa é que o canal feche o ano com crescimento de 8% nas receitas publicitárias em relação a 2011.
A record tambeem vem comemorando os índices de audiência e o crescente faturamento. A emissora saiu dos 6 pontos em 2007 e, entre 2008 e 2011, manteve os 7 pontos de audiência. O faturamento, no entanto, passou por aumento significativo neste período, saindo de R$ 1,36 bilhão e chegando aos R$ 3,37 bilhões. Para Walter Zagari, vice-precidente comercial da Record, a concentração de investimentos publicitários na TV acontece devido à abrangência do meio. “Devido sua alta penetração, a TV aberta é quase que obrigatória na mídia dos anunciantes que desejam falar com aproximadamente 100% dos consumidores. Nenhum meio com tecnologia de som e imagem é tão ou mais eficiente que a TV aberta quando se pretende atingir a grande massa consumidora”, diz o executivo. “Estou ciente que atualmente as verbas de mídias estão pulverizadas entre os meios, mas o retorno do capital investido virá, sem medo de errar, do meio com a maior cobertura, que é a TV aberta”.
Flávio Ferrari, ex-CEO do Ibope, hoje sócio na UNIT34, uma consultoria cuja proposta é identificar oportunidades estratégicas para os clientes, observa que o assunto queda de audiência na televisão é complexo, não se pode tratar como simples perda de audiência. Não é motivo para surpresas, no entanto, as razões pelas quais o meio concentra os investimentos publicitários. “A TV ainda é de longe a mídia mais eficaz para transmitir uma mensagem do ponto de vista do custo/benefício. A última mídia a perder investimentos publicitários é a televisão. Paga-se muito barato para atingir muitas pessoas”, explica.
O executivo enumera algumas razões que fazem a TV aberta ser a menina dos olhos dos planejamentos de mídia. Entre eles, estão a simultaneidade, a capacidade de atingir muitas pessoas ao mesmo tempo; a capacidade de gerar buzz, pautando outros meios e as redes sociais; e as incerteza no cenário de mídia. “Com a chegada do cenário digital, a plataforma já não define mídia. Você tem telefone celulares que permitem assistir TV no telefone, estações de rádio sintonizadas na Internet. As barreiras entre as mídias ficaram muito mais fluídas”, ressalta, chegando a uma conclusão parecida com a de Zagari. “Você pega um momento em que o cenário de mídia mudou e cruza isso com o fato de que nas empresas não existe espaço para experimentar. Na dúvida, melhor fazer o que é mais seguro”.
Colin McAllister, sócio da empresa italiana Sevendots, que também identifica oportunidades de crescimento para marcas e é parceira da UNIT34, de Flávio Ferrari, afirma, com base em estudo que engloba vários mercados, que no cenário mundial a TV ainda tem levado vantagem sobre os demais meios, especialmente nos países emergentes. “Os anunciantes têm a TV como principal ferramenta nestes mercados” de McAllister.
Ele também chama a atenção para o fato de que o aparelho de televisão em si é menos importante do que costumava ser, principalmente em países desenvolvidos como os Estados Unidos. “As pessoas estão usando mais os seus tablets e os seus telefones mobile. Isso muda a audiência. Outro aspecto é que as pessoas estão mais conectadas à web, há mais vídeo circulando. É uma oportunidade para anunciantes”, sugere.
McAllister acredita que, apesar de os novos meios apresentarem boas oportunidades, muitas vezes ainda representam algum risco. A TV tem técnicas de mensuração seguras e as empresas precisam avaliar o retorno sobre investimento (ROI). “O que acontece é que a televisão não vai mudar muito, mas haverá uma substituicnao crescente das outras mídias”, avalia.
Carta coringa
Os publicitários têm uma visão bastante parecida com a dos executivos de TV e dos especialistas a respeito da concentração dos investimentos. “A diferença de reverberação para os outros meios ainda é muito grande” diz Luiz Ritton, vice-presidente de mídia da Lew’ Lara/ TBWA. Ele observa que apesar dos custos a televisão apresenta alta rentabilidade para os anunciantes. “Os custos não param de crescer e os aumentos de tabela influenciam no faturamento das emissoras, mas é um preço que ainda compensa. A rentabilidade é muito alta. Não tem discussão”.
“Independentemente de queda de audiência, ainda é muito audiência”, afirma Paulo Gregoraci, vice-chairman e COO da WMcCann, para quem a TV tem ainda grande poder regional. “O Brasil é um país continental, você tem mercados com grande potencial. Cada anunciante tem sua análise de distribuição de produtos, com regiões onde é mais forte, menos forte, onde eles querem competir mais. Você só pode fazer pesos diferenciados com compra regional”, conta.
Octávio Florisbal, da Globo, explica que o regionalismo tem sido importante para o faturamento da emissora e conta que isso tem relação direta com o crescimento econômico do país, principalmente nas regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste. No Sul e no Sudeste, o maior crescimento vem das cidades do interior. “Isso deve continuar nos próximos anos. Terá reflexo vigoroso no faturamento publicitário.”
Walter Zagari, da Record, mostra que a rede apresentou uma variaçnao pequena na origem do faturamento nos últimos três anos. Em 2009, o nacional (NET) correspondia a 80% do faturamento . Em 2010 foi para 73% e em 2011 para 80%. “O valor absoluto foi superior tanto no NET como no local em função do crescimento da verba em TV nesses últimos anos”, afirma.
Novas praças entram na mediação do Ibope Media, segundo Dora Câmera, diretora comercial, devido às demandas do mercado. “Era uma necessidade ter uma apuração com mais foco”, diz Belém, por exemplo, entrou para a mediação em 2010 e apresentou crescimento de 6% em um ano.
Ainda com base no crescimento econômico e no potencial de consumo das classes emergentes, Renato Meireller, diretor do instituto de pesquisa Data Popular, que tem foco em mercados de baixa renda, afirma que vários clientes o têm procurado para entender melhor o merchandising, que costuma funcionar bastante com a classe C. “Há mais interação, mais tempo para explicar o produto, o apresentador fala bastante com o público dele, a dispersão é menor”, destaca. O vice-presidente de mídia da Leo Burnett Tailor Made, Fernando Sales explica que a demanda principal ainda é por comerciais de 30 segundos, mas existe um movimento mundial em direção ao conteúdo.
Momento especial
Segundo Octávio Florisbal, toda a evolução tecnológia e as possibilidades que apresentam as novas plataformas apresentam para o meio televisão fazem com que a televisão viva um momento “muito especial”. Assistir televisão torna-se mais uma atividade mais prazerosa com a tecnologia HD. O conteúdo móvel e a Internet podem trazer novas possibilidades comerciais. Os novos hábitos de consumo de mídia, como o de assistir televisão ao mesmo tempo em que se navega pelas redes sociais, ou as muitas horas que as pessoas passam no transporte público, no trajeto entre casa e trabalho, são vistos como oportunidades. Aproveitá-las depende da capacidade que as empresas cujo negócio principal é a televisão têm de dominar as especificidades dos outros meios.
[Postada por Mariana Galvão]
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