O canal de humor no YouTube surgiu para fazer piadas que não seriam permitidas na televisão. Virou muito mais do que isso


Esquetes de humor que arrisquem falar abertamente sobre drogas, religião, sexo ou qualquer outro tema que possa gerar algum mal entendido com o grande público passam longe da programação da televisão. Piadas com marcas, personagens históricos, palavrões e situações constrangedoras também não são bem vistas. Não funciona e não é preciso arriscar, dizem. Que público vai ver isso?


Publicado originalmente no site: http://blogs.estadao.com.br/link/bem-alem-da-tv/

Sexta-feira, 11 de janeiro de 2013, 22h17

Vinicius Felix

Essa barreira para trabalhar com comédia era a principal frustração do humorista Fábio Porchat depois do cancelamento do programa Junto e Misturado, criado por Bruno Mazzeo e exibido na Globo em 2010, em que ele atuava e também cuidava do texto. Criar um programa na internet que pudesse ir além dos limites impostos pela TV se tornou uma necessidade. Virou realidade no ano passado com a criação do canal Porta dos Fundos no YouTube, ao lado de Gregório Duviviver, que também fez Junto e Misturado, Antônio Tabet, que faz o site Kibe Loco, o publicitário João Vicente de Castro e Ian SBF, sócio de Porchat na produtora Fondo Filmes e que também é responsável por outro canal de humor do YouTube, o Anões em Chamas.

“Se perguntar sobre o começo, cada um vai dizer uma coisa diferente. Cada um veio com um pedacinho da ideia. Éramos amigos, foi um momento ‘vamos bolar um canal?’”, disse Ian.

O Porta dos Fundos se compromete a publicar dois vídeos inéditos por semana, toda segunda e quinta às 11h, e mais um programa mensal de quinze minutos. Com isso, todos os limites que frustravam Porchat se transformaram em um canal com quase 450 mil inscritos e mais de 59 milhões de exibições – eram 56 vídeos até sexta-feira.

Sem TV. Em 2012, o canal já ganhou o reconhecimento da tradicional premiação da APCA (Associação Paulista dos Críticos de Arte) e ganhou o prêmio na categoria “Melhor Programa de Humor na TV”, mesmo que não esteja na televisão convencional. “Isso mostra que estávamos certos no que acreditávamos. A gente queria fazer o humor que sabemos que é divertido, que as pessoas vão dar risada. É só acreditar um pouquinho”, diz Porchat. Ele afirma que o grupo já foi procurado por todas as emissoras, interessadas em levar a ideia para a televisão.

O plano é não deixar a internet. O objetivo nunca foi esse. Porchat, por exemplo, já está na TV há muito tempo. Atualmente participa do programa A Grande Família e é roteirista do Esquenta. Duvivier é protagonista de um seriado no Multishow e Ian também produz para o canal.

O elenco fixo – um detalhe reforçado por Ian e Porchat como obrigatório e fundamental para o sucesso deles – também tem outros trabalhos. Clarice Falcão mantém carreira de cantora, Marcus Majella participa de séries no Multishow e Marcos Veras trabalha na Globo, em programas como Encontro com Fátima Bernardes. Uma mistura de trabalhos que casa com a afirmação de Porchat: “Estou no cinema, na TV aberta, fechada e na internet. E os veículos não são excludentes, eles se somam”.

Mesmo que Jesus seja personagem de uma esquete ou uma reunião mal sucedida da Ku Klux Klan vire piada, o Porta dos Fundos não ganhou destaque por ser polêmico ou grosseiro – alguns comentários no YouTube chegam a reclamar do conteúdo.

Boa parte do reconhecimento está em um tipo de piada que parece ser tiro certo na internet: a reclamação e brincadeira com marcas que irritam as pessoas, em especial adultos, um público que Porchat considera ainda carente quando o assunto é humor na internet. Com o Anões em Chamas, ele já tinha acertado uma vez com uma esquete em que sofre para cancelar um serviço de operadora de celular. Foram mais de 4 milhões de visualizações. A indireta para a TIM era clara. A fórmula se repetiu com sucesso do Porta dos Fundos.

Um quadro ironizando o atendimento da rede de fast-food Spoleto fez sucesso mas, em vez de receberem um processo da empresa reclamando da piada, ganharam seu apoio. A marca resolveu patrocinar o canal, assumir que o vídeo era para ela e produzir continuações utilizando o elenco do canal para publicidade. O Porta dos Fundos, uma iniciativa que era paga do próprio bolso dos cinco fundadores, passou então a dar dinheiro e a iniciativa da Spoleto gerou um interesse de outras empresas para a criação de produtos semelhantes. Porchat evita comentar quais são os clientes. Diz apenas que eles produzem vídeos internos para empresas e que não utilizarão o canal para fazer propaganda. “Vamos fazer isso no canal do cara que contratar.”

A verba permite que eles se dediquem ao projeto, que não é tratado como algo secundário na carreira dos integrantes. “É um trabalho como a Globo ou o cinema. Temos dois dias fixos na semana em que nós cinco nos encontramos para ler e aprovar textos, falar do andamento da empresa em geral, da área comercial e criativa. Ao longo da semana gravamos os vídeos”, explica Porchat.

O próximo passo do grupo é a tela do cinema – talvez ainda neste ano. Os detalhes ainda são escassos e a produção está começando. Porchat afirma que agora a equipe trabalha no roteiro, mas ainda não há nada definido. No momento, o último passo foi a criação de um mais um canal, o Fundos da Porta, exclusivo para erros de gravação. Foi um resultado dos pedidos do público, que queria mais material do grupo.

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