A TV paga estabelece seus elencos e padrões visuais



Publicado originalmente no site: http://kogut.oglobo.globo.com/noticias-da-tv

Quarta-feira, 15 de maio de 2013, 09h05

Patrícia Kogut


Os sinais da maioridade da TV por assinatura no Brasil estão expressos nos números de usuários hoje (o setor fechou 2012 com 16,2 milhões). E também nas prospecções, nos últimos tempos, com a economia aquecida, muito otimistas. Não se trata mais de um serviço para a elite. Ele chegou a inúmeros lares brasileiros e, não raro, via pacotes combo, o que mostra que a internet também está se democratizando. Ainda assim, até aqui, a TV aberta era a matriz da linguagem e dona do padrão estético da totalidade da criação televisiva. A produção do cabo era um reflexo, às vezes pálido, desse modelo.

Anteontem, assistindo a “As canalhas” (GNT) com Alessandra Colassanti no papel principal (muito bem, por sinal), caiu a ficha de que até isso começa a mudar. Os canais por assinatura, aos poucos, vêm construindo seus próprios elencos. Há, no GNT, na HBO, no Multishow, no Gloob, só para citar alguns, talentos pouco vistos nas emissoras abertas. São inúmeros os exemplos. Em “Copa Hotel”, vemos brilhar Felipe Rocha. Ele já fez uma ou outra participação em novelas da Globo, mas sua carreira foi no teatro como ator, músico e diretor. Na série do GNT, seu bom trabalho grita e não passa despercebido nem aos olhos mais distraídos. Eucir de Souza, o juiz de “(fdp)”, produção da Prodigo para a HBO, também recebeu uma chance jamais experimentada na TV aberta e deixou ótimas lembranças para o público.

De volta ao GNT, na primeira temporada de “Sessão de terapia”, vimos alguns desempenhos excepcionais. Entre eles, Sérgio Guizé, um atirador de elite e freguês do divã do programa. Foi notado por Ricardo Linhares, autor de “Saramandaia”, e convidado para um papel de destaque na novela das 23h da Globo. O mesmo aconteceu com André Frateschi. Também chamado por Linhares, interpretará o Doutor Rochinha (que na primeira versão era José Augusto Branco). Nem Guizé nem Frateschi foram formados pela TV a cabo. Ambos têm história prévia no teatro. Mas foi essa a janela que deu a eles a visibilidade que mereciam.

Dá para fazer uma lista comprida de exemplos e ela tende a crescer. Para além dos elencos, existe uma linguagem visual que chama a atenção. Ela está nas vinhetas da Globo News, as mais inspiradas de toda a televisão — além de bonitas, possuem grande poder de comunicação.

Há, entretanto, que se fazer ressalvas. A primeira, talvez a mais importante, diz respeito à confusão equivocada entre falta de qualidade e linguagem. Quando os programas do cabo são mambembes, significa que não contam com meios de produção potentes — como deveriam. Isso não pode ser aceito como uma linguagem em si. Se a TV paga está estabelecendo uma identidade estética e narrativa que ambiciona até um dia ser dominante, sua obrigação é perseguir o bom nível técnico. Programas tipo “uma câmera na mão e vamos nessa” têm pouco espaço num ambiente que se pretende adulto. Maioridade também é capacidade de competir.

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