Tela Viva: Antigo Vilões, Novos Amigos


No principal evento de eletrônica de consumo, o CES, detentores de conteúdo audiovisual mostram que venceram o medo inicial e buscam formas de trabalhar com as plataformas digitais.


Publicado originalmente na Revista Tela Viva

Edição de jan/fev de 2013.

Por Fernando Lauterjung



O bicho-papão que vivia debaixo da cama dos detentores de conteúdo audiovisual se revelou e, para a surpresa dos mais reativos, se mostrou amigável. O desafio agora é encontrar uma forma de se relacionar com o novo aliado. No Consumer Eletronic Show, que aconteceu no início do ano em Las Vegas, ficou claro que os grandes estúdios já não temem os serviços over-the-top e os dispositivos conectados, mas que ainda não encontraram a forma de explorar ao máximo as novas formas de acesso ao consumidor. Para alguns, nem encontrarão, pois a nova realidade não permitirá que fórmulas sejam desenvolvidas, e os donos dos conteúdos terão que ser mais flexíveis e criativos.

Os principais executivos de distribuição de três maiores estúdios norte-americanos apontaram que não há mais dúvidas de que o digital não está chegando para canibalizar a indústria, ou mesmo apenas a distribuição de conteúdo através de mídia física. David Bishop, presidente da Sony Pictures Entertaiment, diz que os tablets são hoje uma das maiores apostas das distribuidoras. No entanto, “nós precisamos saber mudar nossa estratégia para nos adaptarmos à nova realidade”. Segundo ele, hoje há uma estratégia para cada lançamento. “Alguns filmes são feitos para o mercado de locação, enquanto certo tipo de filme pode performar bem em determinado tipo de distribuição. É preciso ser um pouco mais flexível na estratégia de distribuição do que costumávamos ser no passado”, diz o executivo.

Mike Dunn, presidente da Twentieth Century Fox Entertainment, concorda que o digital traz novas possibilidades. “Os dispositivos portáteis que temos hoje ajudam muito. Se eu costumava comprar 30 livros por ano, agora compro 60, porque tenho meu iPad sempre comigo. Se alguém comenta sobre um livro comigo, eu passo a ter esse livro em dois segundos.”, diz . É duro fazer esta comparação, mas eu quero que os filmes sejam os livros digitais”, brinca.

Para Thomas Gewecke, presidente da Warner Bros. Digital Distribution, uma das vantagens da distribuição digital sobre a física é que o consumidor tem o ponto de venda sempre a mão, através do iTunes, da Amazon ou de outra loja de conteúdo online.” O desafio é ajudar o consumidor a encontrar o que procura. Para isso, há as ferramentas de sugestão”, diz.

E A TV PAGA?

Mesmo para a tv por assinatura, a mais reativa quando surgiram os serviços over-the-top, o digital se tornou fundamental- se não para ampliar recitas, para estancar a sangria de assinantes, sobretudo no complicado mercado estadunidense, estagnado há anos. O desafio para este elo do setor é ainda maior. Segundo Steve Harris, vice-presidente de novas mídias da operadora Scripps Network Interactive, há alguns anos o OTT significava uma forma de distribuição concorrente à Tv por assinatura, mas hoje isto já é parte do serviço. A dificuldade atual dos operadores é oferecer o conteúdo em múltiplas plataformas, o que passa não apenas por uma questão tecnológica, mas por muita negociação com os detentores do conteúdo.

Chris Wagner, vice-presidente executivo da neuLion- que fornece tecnologia para distribuição de conteúdo por demanda e ao vivo online por múltiplas plataformas- lembra que hoje a estratégia de Tv everywhere das operadoras se resume a “ qualquer lugar da casa do assinante”. Isto porque as operadoras ainda não conseguiram negociar os direitos para levar o conteúdo para fora das casas, e é aí que está o maior desafio.

Marty Roberts, vice-presidente de vendas e marketing da empresa de publicação e gerenciamento de vídeo online thePlatform, diz que a questão é uma conversa em andamento entre operadores e os donos dos conteúdos. “Operadoras e programadoras já estão negociando”, garante. No entanto, há entre as partes uma “batalha”, diz Jeffrey Binder, da Genovation Capital. Segundo eles, a tendência entre os donos do conteúdo é permitir que o conteúdo seja oferecido efetivamente em qualquer lugar pelas operadoras, mas em seus termos, que ainda não estão claros.

David Del Beccaro, presidente da rede multiplataforma Music Choice. Expôs os termos. Ele diz que os operadores precisam estar preparados para levar à negociação a oferta de dados sobre o consumo do conteúdo. “Nós precisamos saber o que está sendo assistido e onde, para podermos explorar a publicidade”, destaca, embora afirme que a possibilidade de gerar receitas significativa com publicidade na distribuição de plataforma não deve acontecer em um curto prazo. “Acredito que em um ano, a negociação entre prestadores de serviço de donos de conteúdo estará resolvida. Mas as receitas com publicidade estão em um horizonte mais distante. Talvez quatro anos”, arrisca.

Beccaro minimizou a possibilidade de os serviços de Tv Paga canibalizarem este serviço. “Está cada vez mais difícil convencer o consumidor a assinar um conteúdo.Acho que o serviço multicanal sempre será a principal fonte de conteúdo”, diz.

Para o advogado Jeffrey Liebenson, especializado em conteúdo digital, há uma pressão das operadoras de Tv por assinatura para que seus fornecedores de conteúdo não negociem com plataformas over-the-top ou mesmo para que não levem seus conteúdos diretamente para as smart tvs em modelos por assinatura ou transacional. Com isso, disse o advogado, o que “sobra”para as plataformas de smart Tv é muito pouco. Quando as operadoras ou as programadoras levam às Smart Tvs seus conteúdos exclusivamente às suas bases de assinantes, as plataformas assumem um papel de “meros autenticadores”. “É isso que estas plataformas querem ser?”, questiona o advogado.

LANÇAMENTOS

Há alguns anos, causaria estranhamento o fato de os debates acima terem acontecido no maior evento de eletrônica de consumo do mundo. Hoje, no entanto, os fabricantes não entregam mais apenas o hardware. Se no passado os maiores fabricantes dos dispositivos de recepção e execução de conteúdo não exerciam papel algum na cadeia de produção e distribuição de conteúdo, hoje representam a ponta final. São eles que têm o acesso final ao consumidor. E o papel do hardware e do software cada vez mais se confunde.

Nos anos recentes, os principais lançamentos dos fabricantes de televisores foram os equipamentos conectados, as smart Tvs. Agora, foram apresentadas apenas algumas evoluções menores na tecnologia. Um dos mais importantes anúncios neste sentido foi a ampliação da Smart Tv Alliance- LG Eletronic, TP Vision (Phillips) e Toshiba- os fabricantes Panasonic, ABOX42 e TechnniSat; e os provedores de soluções IBM e Specific Media.

Além disso, a aliança adiantou que deve lançar um novo SDK (software development kit) este ano. A nova versão promete trazer upgrades às especificações de HTML5, CSS3 e JavaScript; além de suporte a vídeo 3D e à especificação MPEG-DASH, bem como mais opções de digital rights management (DRM). Também será apresentado um novo emulador comum, que permite testar os aplicativos garantindo a compatibilidade com todos os equipamentos dos fabricantes membros da associação.

Desta vez, chamaram a atenção lançamentos à moda antiga: hardware esperando que os produtores de conteúdo respondam à demanda gerada pela nova tecnologia. Os principais fabricantes de televisores apresentaram suas versões de equipamentos baseados em OLED. A tecnologia de imagem, com taxas de contraste muito superiores, uma vez que cada pixel é uma fonte independente de luz.

Além disso, o 4K, ou ultra definition (UDTV) também reinou no evento. Segundo a Consumer Eletronics Association, que promove o evento, aproximadamente 50 modelos de televisores 4K foram apresentados durante a feira. A associação prevê que o preço médio deste equipamento deve cair de US$ 7 mil, em 2013, para US$ 2,8 mil no próximo ano.

Tanto a Panasonic quanto a Sony juntaram as duas tecnologias mais promissoras para o mercado de televisão em um único produto. A primeira apresentou um televisor OLED de 4K com 56 polegadas. O modelo deve chegar ao mercado no agora segundo semestre deste ano, com a expectativa de ser o primeiro modelo comercial a unir as duas tecnologias.

Já a Sony apresentou no evento um protótipo de Tv 4K OLED. O modelo também tem 56 polegadas e traz, além da maior definição, o alto contraste e maior brilho, características da tecnologia OLED.

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