Tela Viva: O jogo de satélite

Oi contrata toda a capacidade do novo satélite SES-6 para o Brasil e promete uma mudança importante em sua estratégia de tv paga. Vantagem é ter uma capacidade que, hoje, ninguém mais tem.


Publicado originalmente na Revista Tela Viva

Edição de Junho de 2013

Samuel Possebon


Pode-se falar o que for da convergência de redes, das tecnologias de transmissão de banda larga por meio de redes de fibra ótica ou cabos coaxiais. Mas o que tem prevalecido no Brasil quando o assunto é TV por assinatura é o bom e velho DTH. E no universo da Tv paga via satélite, o elemento essencial é o satélite. O momento é de definições importantes nesse cenário.

O primeiro passo foi dado pela Oi Tv, braço de Tv por assinatura da Oi. A empresa anunciou no começo de junho uma mudança importante em sua estratégia: a contratação de um satélite quase inteiramente próprio junto à SES, uma das maiores operadoras de satélite do mundo, pelos próximos 15 anos. É uma mudança e tanto nos planos da Oi. Até aqui, a operadora vinha confiando a infraestrutura de seu serviço à Media NetWorks, empresa do grupo Telefônica que opera a plataforma de DTH para diversas empresas, entre elas, no Brasil, a Vivo Tv, a Oi Tv e a CTBC TV (Algar Telecom). Com um novo satélite, a Oi prepara uma transição (lenta, mas irreversível) para uma nova plataforma.

O elemento motivador desse movimento foi a necessidade de mudar a tática de conquista de mercado. Para crescer e disputar mercado com Sky e Claro Tv (as concorrentes diretas no mercado de Tv paga via satélite), a Oi Tv precisava se diferenciar, e a chave para isso é aumentar significativamente a quantidade de canais, sobretudo canais em alta definição, e mudar o empacotamento, com novas opções, mais conteúdo sob demanda. “ Estamos fazendo essa transição porque precisamos de mais canais, mais conteúdos, porque temos uma série de obrigações do SeAC a cumprir e porque o serviço de Tv por assinatura é cada vez mais importante na nossa estratégia residencial”, diz Ariel Dascal, diretor da Oi Tv.

São 28 os transponders contratados no SES-6, satélite lançado com sucesso a partir de junho e que nos próximos dois meses deve estar posicionado, testado e operacional. É o tempo que a Oi precisa para construir seu novo uplink center Alvorada, na Barra da Tijuca, zona sul do Rio de Janeiro, e que logo ganhará redundância de um novo uplink center, em Guaratiba, também no Rio. Com isso, a Oi deixa de depender exclusivamente das instalações da Media Networks no Peru. “Vamos conviver com as duas plataformas por muito tempo. O novo satélite será usado no upsell e nas novas vendas, para os clientes que entrarem na base a partir de agora e para aqueles que migrarem para pacotes mais altos”, explica Dascal. Não é uma operação simples ter dois satéçlites em posições diferentes, dois sistemas e dois centros de operação. O satélite atual usado pela Media Networks para os sinais da Oi é o Amazonas 2, da Hispamar ( da qual a Oi é sócia com 19%). Ele fica na posição 61º W. O SES-6 ficará na posição 40,5º W, o que impede o uso das duas antenas para o mesmo satélite.

Por outro lado, o novo satélite praticamente dobra a capacidade de canais que a Oi Tv tem hoje. “No HD, mais conteúdos em pay-per-view e on-demand, uma plataforma de DVR e posteriormente conteúdos over-the-top”, diz o executivo. Fontes de mercado dizem que a primeira estratégia da Oi será colocar uma grande quantidade de canais da Tv Globo, de diferentes afiliadas e inclusive em HD, no line-up de seus serviços, o que nenhuma operadora de DHT hoje oferece de forma tão completa e abrangente.

Negociação

A negociação com a SES começou n início de 2012. Em princípio, era apenas uma negociação para venda de mais capacidade em um outro satélite da empresa, o SES-4. Quando soube que a SES teria um satélite com grande capacidade em banda Ku para o Brasil em 2013, a Oi abriu os olhos. A oportunidade casou com a estratégia da empresa de apostar no DHT para aumentar a fidelidade de seu cliente residencial. Desde então, a Oi foi a operadora que mais cresceu no mercado brasileiro e deve chegar ao final do ano com cerca de um milhão de assinantes.

A negociação cresceu e acabou se tornando um dos maiores contratos individuais da SES. Comparável apenas ao acordo que a operadora tem nos EUA com a Dish, para quem opera uma pequena frota de satélites. O acordo coma Oi praticamente dobra o peso que o Brasil tem nos negócios da SES no mundo e deve significar uma ampliação significativa da presença da empresa no país.

A chave para que a SES conseguisse “vender” a oportunidade para a Oi foi uma certa flexibilidade na configuração do satélite. Inicialmente, a capacidade para o Brasil era menor, mas como o satélite ainda estava sendo fabricado, foi possível negociar com a Astrium (fabricante do satélite) a reconfiguração de alguns feixes originalmente desenhados para atender a região andina, o Cone Sul e a América do Norte. Com isso, toda a capacidade para o Brasil, e praticamente toda a capacidade em Ku do satélite, ficará com a Oi. No meio do caminho, Sky e GVT chegaram a manifestar-se junto a SES interesse por adquirir capacidade satelital, mas o SES-6 já estava reservado para a Oi.

A Oi, com isso, ganha uma vantagem competitiva importante, mas curta. Se conseguir colocar o satélite em operação no último trimestre do ano, a Oi terá praticamente nove meses com uma capacidade de canais sem precedentes no mercado de DTH. É sabido que todas as operadoras concorrentes estão no limite de sua capacidade, sobretudo em função das obrigações de carregamento do Serviço de Acesso Condicionado (SeAC) e do rápido crescimento da oferta de conteúdos em alta definição.

Concorrentes

A Sky, por exemplo, não tem conseguido viabilizar uma solução definitiva nem mesmo para canais de altíssima demanda, como o Sportv HD. Também tem alegado ao governo brasileiro que a falta de espaço no satélite é a razão para não conseguir cumprir algumas das cotas de empacotamento previstas na lei do SeAC.

Da mesma forma, a GVT TV tem encontrado dificuldades de expandir sua base de canais HD, o que é um problema, já que o diferencial da empresa, depois acompanhado pela própria Oi, foi ter 100% de seus novos clientes em canais HD.

A GVT teria um respiro este ano, mas os planos foram, literalmente por água abaixo. Em janeiro, o satélite Intelsat 27, que substituiria os satélites Intelsat 805 e Galaxy 11 (ambos em 55º W) para aliviar a demanda da operadora, caiu no mar durante o lançamento. A GVT ainda não apresentou seu plano de contingência, mas crescem as apostas de que pode estar negociando com a Dish, operadora norte-americana que já deu todas as provas de que entrará no mercado brasileiro, só ainda não anunciou como. Sabe-se apenas que a Dish já reposicionou uma satélite de grande capacidade (o Echostar XV) para a posição 45° W, adquirida em leilão da Anatel em 2011 pelo preço recorde de US$ 90 milhões.

Para a GVT fechar um acordo operacional com a Dish, teria que rever a sua estratégia de apostar em uma plataforma híbrida de DTH com banda larga, já que o grupo Echostar (controlador da Dish) dificilmente abriria mão de sua própria tecnologia. Para a GVT Tv, que já chega à 500 mil assinantes, isso seria um grande problema, mas menor do que ficar sem capacidade de satélite (seu satélite atual tem vida útil até meados de 2016).

Mas a falha do Intelsat 27 não foi um problema só para a GVT. Também prejudicou os planos da Sky. Segundo fontes de mercado, um dos dois que o Intelsat 27 substituiria (o Galaxy 11 ou o Intelsat 805) seria remanejado para atender a Sky até que elativesse um novo satélite específico. Hoje a Sky depende do lotado Intelsat 11. Sabe-se que há tempos a operadora busca viabilizar um novo satélite próprio. Mas mesmo sendo a principal empresa do grupo DirecTv fora do EUA, a preferência por capacidade, até aqui, foi dada à Sky Panamericana, que opera nos demais países da América Latina.

Após a falha do Intelsat, na conferência com investidores para os resultados de 2012, a DirecTv finalmente anunciou planos de colocar um satélite específico para atender a Brasil, mas isso não deve acontecer até pelo menos 2016. Oficialmente, ainda não há notícias de um contrato acertado com a Intelsat.

Mas a Sky já teria um novo artefato na mesma posição de seu satélite atual (trata-se do Intelsat 9), mas apenas com sinal de testes. Segundo apurou este noticiário, este satélite pode estar sendo reservado para dois usos: ou para o lançamento do serviço em HD da Sky no México ou para a transmissão da Copa do Mundo. Não deve servir, portanto, para dar mais capacidade para a Sky, pelo menos por enquanto.

Já a Claro Tv espera para ter o seu novo satélite, o StarOne C4, lançado no meio de 2014. Se tudo correr bem, ele estará em operação entre setembro e outubro do próximo ano. Será um satélite inteiro só para o DTH da Embratel, o que ampliará significativamente a capacidade de operação da Claro Tv. Mas até lá, a operadora terá que conviver com as limitações ao número de anais atual.

O quarto grande player de DTH brasileiro é a Vivo Tv (Telefônica), que depende da plataforma da Media Networks, e dificilmente vai mudar esse modelo. A Media Networks tem hoje um limite ao número de canais HD que consegue colocar e, por ser uma operação de distribuição de sinais compartilhada entre várias operadoras, não pode fazer movimentos pensando na estratégia de apenas um cliente. A Vivo Tv dificilmente abriria mão de usar a plataforma da Media Networks, até pelo vínculo societário entre as duas empresas, ainda que conversas com a Dish, iniciadas e interrompidas em 2012, possam ter sido retomadas. A Vivo Tv já relançou seu serviço de DTH no estado de São Paulo.

Com isso, a Oi Tv terá, se aproveitar a capacidade extra que o SES-6oferece, uma grande vantagem competitiva, pelo menos por algum tempo, em relação aos seus concorrentes diretos. O problema para a operadora não é mais satélite, mas a própria capacidade financeira da Oi de investir para crescer enquanto os concorrentes estão sem a mesma capacidade.

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