Tela Viva: O Som do Conteúdo


Com o boom dos documentários, programas e séries para a tv, produtoras de áudio investem, adaptando sua estrutura, equipamentos e músicos para trabalhos de fôlego.

Publicado originalmente na Revista Tela Viva

Edição de junho de 2013

Lizandra de Almeida



Com a ampliação do mercado de produção audiovisual que vem ocorrendo nos últimos anos, muitas produtoras de áudio que antes só trabalhavam com publicidade estão entrando em um nicho que antes era explorado por poucos. Fundada há 15 anos, a Input Arte Sonora também começou com publicidade, mas encontrou nos documentários e programas de tv o espaço em que se sentia mais confortável. O produtor executivo Mario Poi conta que há cerca de dez anos este é o foco da produtora.

O dono da Input, Alexandre Guerra, estudou música e composição de trilhas de cinema nos Estados Unidos, mas ao voltar para o Brasil encontrou o país no início da retomada da produção de cinema, quando havia um espaço ainda muito pequeno para a produção de trilhas para filmes. As Tvs por assinatura, porém, lentamente começavam a produzir programas com produção independente, e eles então aproveitaram essa oportunidade. Hoje, já computam cerca de 120 projetos executados em séries, documentários, programas de Tv, curtas e longas-metragens.

Agora, o aumento da produção já está sendo lei que obriga as emissoras de Tv por assinatura a exibir uma faixa de programação nacional em horários nobres- e com isso outras produtoras também começam a se voltar para esse nicho. A Play it Again, de Tula Minassian, criou em 2009 a PlayRK30, um braço voltado para a criação, produção e finalização de áudio para esse mercado. Segundo Minassian, a ideia era aproveitar melhor a estrutura já existente, que hoje corresponde a 23funcionários e quatro estúdios. A produtora se equipou para finalizar o som em 5.1 e começou a buscar projetos de fôlego para completar o faturamento que era predominantemente vindo da publicidade.

À frente da PlayRK30 está Hélio Leite, que já atuava com finalização de áudio nos Estúdios Mega, e hoje está ajudando a reforçar o portfólio da casa. Entre os trabalhos já produzidos, estão os documentários sobreo centenário do Corinthians e do Santos, uma série sobre esportes radicais para a ESPN com a O2 Files e um documentário sobre Bob Burnquist para a Gullane, entre outras produções, especialmente de curta-metragens e programas de tv, como o recente curta “ O amuleto do dragão”, de João Paulo de Andrade, produzido pela O2 Filmes. Um filme de artes marciais, que exigiu uma trilha cheia de suspense.

A Sax So Funny, de Zezinho Mutarelli, está começando agora a formatar um setor para atender a essas produções. “Já fizemos muita coisa, desde abertura de séries até documentários, mas agora estamos realmente olhando para esse mercado com mais atenção”, diz Cezar Brandão, um dos músicos e produtores musicais da casa. “O que é muito legal em trabalhos como documentários, por exemplos, é que temos que fazer bastante pesquisa, mas também trazer pessoas específicas para trabalhar com a gente. Fizemos, por exemplo, um documentário sobre moda de viola e trouxemos um violeiro de Mato Grosso Compusemos o tema, mas na hora de executar ele sugeriu uma variação no modo de tocar, vimos que cabia e então aproveitamos esse conhecimento dele”, conta Sergio Fouad, que também integra a equipe da Sax So Funny.

As possibilidades artísticas são o que mais estimulam os músicos e produtores de áudio, e foi o que chamou atenção da Input desde o início. Em sua experiência, a produtora inclui a gravação de grandes orquestras sinfônicas, principalmente fora do país. “Quando fizemos a trilha de uma série de tv sobre animais em extinção, fomos a Budapeste gravar uma orquestra de 70 músicos”, diz Mario Poi. Ele explica que a produtora já desenvolveu um know-how para gravações desse tipo, e que produções maiores costumam exigir viagens para o exterior. “Não se trata nem de uma diferença entre o estúdio daqui ou de lá, mas em outros países há técnicos de gravação mais bem preparados, assim como uma oferta muito maior de músicos. No Brasil, em geral não conseguimos reunir maia do que 20 ou 25 e acaba saindo o mesmo custo de ir gravar em Budapeste com 70, por exemplo.”

A produtora também já produziu em Viena, em Londres, Chile e na Argentina. “Quando fizemos a série ‘Brasil Secreto’, de Lawrence Wahba, gravamos o foley em um estúdio em Bristol, especializado em gravação de sons da natureza. Eles têm até uma piscina para a gravação de sons de água”, afirma Poi. “O mais interessante é que acabamos explorando assuntos que nunca imaginamos.” Este ano, a produtora já está trabalhando na segunda temporada da série “Tabu”, da National Geographic.

Em alguns momentos, o grande desafio da produtora é a mixagem, como no caso dos documentários musicais, hoje bem frequentes. Sergio Fouad trabalhou em um recente projeto sobre o músico Itamar Assumpção, que envolveu muitas imagens de arquivo, nem sempre bem preservadas. “Nesse caso, o nosso trabalho é fazer o som ficar audível e ao mesmo tempo não descaracterizar a gravação de época. Trabalhamos com matrizes em VHS, U-matic, e temos que mixar em 5.1 para exibir no cinema. O bom é que hoje temos tecnologia para isso”, conta. “Nesse caso, mergulhamos no universo do Itamar Assumpção, nas músicas dele, fomos atrás para conhecer”, diz Cezar Brandão.

Rosana de Souza, produtora executiva da A Voz do Brasil, afirma que a produtora também está produzindo programas de conteúdo, em parceria com produtoras de imagem. ”Não há muita diferença da produção publicitária, pois em ambas criamos com a mesma equipe e a mesma qualidade. A diferença são os tempos, a publicidade tem até 60 segundos enquanto o conteúdo pode chegar a 60 minutos”, explica.

Com a tecnologia atual e as imagens cada vez mais impactantes na tela, o papel da trilha também ganha importância em várias dimensões. “O som está cada vez mais importante nas produções. A qualidade está cada vez melhor e o surround trouxe uma série de novas possibilidades. Antes era algo elitista, mas hoje está muito mais popular. E torna nosso trabalho muito mais desafiante, mas também muito mais interessante”, diz Hélio Leite.

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