Seminário IX: Programas de Entrevistas

Universidade Federal Fluminense
Cinema e Audiovisual
Tv e Vídeo
Professor: Felipe Muanis
Grupo: Guilherme Farkas, Nathália Brasil e Rena Föhr




1. Definição

Um programa de entrevista consta de uma conversa com papéis claros: Tem o lado investigador – sendo um ou vários entrevistadores – que formula perguntas; e tem o lado investigado – sendo um ou vários entrevistados – que reage dando as respostas. Conscientemente não se trata de uma conversa equilibrada com direitos iguais, senão de uma investigação jornalística. A duração, a estrutura da conversa, a quantidade dos entrevistadores e entrevistados pode variar.

Apesar dos programas de entrevista, existe o gênero “talk show” que se tornou popular mais tarde que os programas de entrevistas. Precisa-se discernir os programas de entrevista “clássicos” dos talk shows, pelas qualidades seguintes:

Objetivos: Debate, crítica e informação (teor jornalístico)

Conteúdo: Potencialmente, um programa de entrevista pode tratar de qualquer assunto, porém, requer certa relevância, quer dizer, um tema cultural, filosófico, político; não obstante, temas triviais do cotidiano, por exemplo, a vida amorosa de uma pessoa convidada, não são considerados adequados.

Perfil dos convidados: Pessoas famosas com conhecimento / notabilidade em algum aspecto particular, como por exemplo, artistas, políticos, filósofos, músicos, etc (“com bagagem intelectual e reconhecimento social”).

Ambiente: O espetáculo é menos importante num programa clássico que num talk show; é menos show e mais investigação e cultura. Não tem muitas piadas, efeitos, interrupções; no foco está o diálogo.

Jeito do entrevistador: Formal, investigador, à procura da verdade, sem o compromisso de agradar ao convidado.

Cenário e edição: Simples, sem “show effects”. O entrevistador e o convidado se mantêm sentados.

Ás vezes, eles têm formatos “híbridos”, tanto no Brasil quanto em outros países. Ademais, as definições e distinções não são universais: na Alemanha, por exemplo, não se distingue entre programas de entrevista e talk show por estas características, senão pela estrutura da conversa. O formato mais comum de entrevista/talk show na Alemanha é o talk show político, no qual se reúne um grupo de políticos e expertos reconhecidos para falar sobre um tema atual de relevância política ou social, junto com um apresentador que tem a função dirigir a conversa do grupo.

2. Surgimento:

Nos EUA, são chamados de talk shows quaisquer programas que tenham a conversação como base de sua estrutura, incluindo os programas de entrevistas. Eles surgiram na década de 50, a partir de programas de rádio.

No Brasil, há diferenças entre o uso do termo talk show para “programas de entrevistas”. O primeiro tem um tom mais humorístico, busca deixar os convidados mais à vontade e o apresentador conduz o “show”; além disso, apresenta cenário grande que permite apresentações dos convidados quando é o caso. O segundo, é mais formal, pode desestabilizar os convidados (os quais geralmente têm uma boa vivência com os assuntos tratados) com temas polêmicos e o apresentador age para mediar a transmissão de informações; sendo assim, os cenários tendem a ser pequenas de modo que o apresentador e os convidados fiquem sentados.

3. Programas de Entrevista no Brasil

3.1. Fase de experimentação (1950 – 1978)

Os programas televisivos tiveram suas origens em outros meios, como o teleteatro, shows musicais e telejornais. Eles tiveram caráter popular desde o início, o que gerava condenações feitas pelos críticos, os quais acreditavam que esses produtos eram consumidos pelas elites, logo deveriam ser feitos para elas.

Um programa muito rechaçado pelos críticos era o Mesa Redonda do Vídeo, que teve sua estréia em 1952. Ele tinha o objetivo de debater sobre temas de interesse público, que em geral, apelavam para as mazelas da sociedade para atrair audiência.

A partir de 1964, com a Ditadura Militar, o governo ao mesmo tempo em que censurava programas contrários ao poder, investia fortemente na indústria cultural (com o intuito de difundir sua ideologia). As instituições promotoras de cultura como a Embrafilme e a Funarte surgiram nesse período.

3.2. Fase de disseminação (1978 – 1986)

Após a revogação, em 1978, do Ato Constitucional N°5 (AI-5), que fortaleceu a censura, os programas televisivos passaram a incluir assuntos políticos de esquerda e a abordar valores democráticos. Os próprios nomes dos programas tinham relação com o momento político:

Canal Livre (1980 – atualmente; Rede Bandeirantes): programa pelo qual passaram várias figuras importantes e que deu voz à democracia.

 http://www.youtube.com/watch?v=KsXFJDYmjAI

Sem censura (1985 – atualmente; TVE – atual TV Brasil): programa de entrevistas ao vivo diariamente às 16h; até seis convidados participam debatendo assuntos cotidianos.

Roda Viva (1986 – atualmente; TV Cultura): tem um cenário peculiar no qual o convidado fica no centro de uma roda formada por andares acima dele no qual os entrevistadores estão sentados; a cadeira do convidado é giratória, assim ele pode se virar para quem está fazendo a pergunta.

Vox Populi (1977 – 1986; TV Cultura): programa que colocava o cidadão comum ligado ao entrevistador para fazer perguntas ao entrevistado. 

https://www.youtube.com/watch?v=85MTcgTQaog

Abertura (1979 – 1980): discutia questões relacionadas à abertura política, com a participação do público. Eram convidadas figuras importantes nos meios político, cultural, etc. Glauber Rocha apresentava uma quadro semanal no programa no qual entrevistava pessoas nas ruas. Vários pensadores que voltavam do exílio tiveram participação no programa. 

https://www.youtube.com/watch?v=YahbxjiBWMo http://www.youtube.com/watch?v=Y9etC-YLEao

TV Mulher (1980 – 1986; Rede Globo): programa que misturava entrevistas com reportagens. O programa valorizava a mulher na sociedade em transformação, abordando temas de sexualidade, comportamento, relações familiares, etc. 

https://www.youtube.com/watch?v=QgWes342g-U

3.3. Fase de diversificação (1986 – 2010)

Vários talk shows voltados para o entretenimento surgiram nesse período. Os programas de entrevista já existentes, de caráter mais jornalístico, ganharam mais notoriedade por tentarem manter discussões obre temas considerados relevantes para o debate público, como o Roda Viva e o Canal Livre. Além desses, novos programas de entrevista surgiram.

 https://www.youtube.com/watch?v=CGXCElsy3sk https://www.youtube.com/watch?v=C-_zB7ZL1E8

4. Programas de entrevista no Brasil (investigativos e ou ensaísticos), ligados à nossa proposta:

Interessam-nos os programas ditos “de entrevista” pela aproximação ensaística com determinado tema. Pela possibilidade de tratar, inclusive na TV aberta, de temas fundadores da construção da democracia. Tais programas tem um tempo distinto de muitos outros e isso possibilita uma maior aproximação com temas centrais de interesse comum da sociedade brasileira.

São três programas as principais referências:

- Sangue Latino (Canal Brasil)

- Café Filosófico (CPFL Cultura - TV Cultura e outras emissoras)

- Roda Viva (TV Cultura)


Pelo interesse na memória. No relato, no contra.

4.1. Sangue Latino – Canal Brasil




O programa Sangue Latino nos interessa principalmente por seu caráter assumidamente investigativo. Também pelo fato do programa se interessar na memória e no resgate da cultura latino-americana. Sangue Latino é apresentado pelo jornalista Eric Nepomuceno. O programa tem um ar bastante intimista e certo clima bucólico, as imagens são sempre em preto e branco. Sempre se basta da conversa de Eric com o entrevistado, se utilizando também de imagens que se relacionam com o universo da pessoa entrevistada. O programa vai ao ar às quartas-feiras, 21h30. É dividido em dois blocos de 12 minutos e dois intervalos de 3 minutos. Tem créditos iniciais de apresentação e se encerra com algumas informações do entrevistado como ano de nascimento, principais atividades desenvolvidas ao longo da carreira e etc.

4.2. Roda Viva (TV Cultura)


Criado em 1986. Um dos principais programas de entrevista brasileiro. Sua origem tem ligações diretas com a dita “redemocratização” do país após o fim do Regime Militar em 1984. Os entrevistados são sempre figuras importantes e destacadas em áreas como política, jornalismo, cultura, arte, esporte entre outros. O programa já teve diversos mediadores, sendo o primeiro o Rodolpho Gamberini e atualmente é mediado por Mario Sergio Conti.

A estrutura do Roda Viva é bastante investigativa e propícia para a reflexão e debate. O entrevistado se acomoda numa cadeira giratória no meio da sala, envolto por câmeras e convidados especialistas no respectivo tema. O programa é transmitido ao vivo pela TV Cultura às 22h30 de segunda-feira e reprisado às 0h30 de sexta-feira.

A partir de 2008, o Roda Viva passa a utilizar cobertura colaborativa com o Twitter. 2009 o programa inaugura o IPTV Cultura, a webTV da Fundação Padre Anchieta, as transmissões participativas e passa a ser exibido on-line

4.3. Café Filosófico (TV Cultura)


O programa Café Filosófico faz parte de um projeto da Companhia Paulista de Força e Luz (CPFL), o CPFL Cultura. Inaugurado em 2003, o CPFL Cultura tem como sede um espaço de reflexão na cidade de Campinas (SP). Esse local recebe diversos intelectuais para discutir sobretudo sobre as possibilidades e oportunidades do contemporâneo. Esses encontros em Campinas são gravados e dão origem a dois programas que figuram na grade de exibição da TV Cultura e de TVs educativas por todo o Brasil: Café Filosófico e Invenções do Contemporâneo. As programações do CPFL Cultura são abertas e gratuitas.

Os programas do Café Filosófico são divididos por áreas temáticas como: Fundadores do Pensamento do Século XX, Luz na Crise, 100 Anos Inventando o Contemporâneo entre outros. Cada programa é divido em vários módulos, cada um sob a curadoria de um convidado. Os programas tem duração media de 90 minutos.

O programa é transmitido em dois horários: sábado as 2h15 e domingo às 22h.

4.4. Outros exemplos brasileiros de programas de entrevistas ligados à nossa proposta:

- Programa ABERTURA (fevereiro de 1979 a julho de 1980 - TV TUPI)


Um programa bastante inovador e importante nas discussões políticas brasileiras na dita “redemocratização brasileira”

Tinha um quadro apresentado pelo cineasta Glauber Rocha com duração de 30 minutos

Construção de opinião pública. Modelo anti-entrevista e alegórico.

- Programa ERNESTO VARELA (1983 – TV Gazeta)



Personagem Ernesto Varela interpretado pelo jornalista Marcelo Tas. “Repórter de mentira que entrevista personalidades de verdade”.

Abordagem cômica, irônica e com muito humor sobre temas seminais da política e da “redemocratização brasileira”

5. Talk shows, programas de entrevista e programas de debate na Alemanha:

Todos os gêneros que mencionamos também existem na Alemanha. No entanto, forma, popularidade e quantidade dos formatos são diferentes que na televisão brasileira. Nas últimas décadas, duas categorias têm destacado particularmente: Nos anos 90, eram muito populares os talk shows que tratavam temas triviais, com pessoas comuns do dia-dia, que não eram famosas e não possuíam nenhum conhecimento em especial; houve temas como “o meu marido é infiel” e muita briga e ação. Com o tempo, o interesse nesses shows foi diminuindo e hoje em dia quase não são mais exibidos.

O que ganha muita atenção atualmente, e que combina muito mais com o nosso interesse e nossa área de investigação, é um formato chamado talk show político. É parcialmente semelhante ao formato brasileiro “programa de debate”, porém, na Alemanha, é muito popular, produzido de alta qualidade e transmitido nos maiores canais, sobretudo na ARD ("Associação das Empresas Públicas de Radiodifusão da República Federal da Alemanha”). Em total, na televisão alemã, há mais de um talk show político cada dia de semana.

Nesses formatos, reúne-se um grupo de políticos e expertos para discutir um tema política ou socialmente relevante, de preferência com relação a debates atuais no país, mas também temas sociais que importam independente da moda. Para ganhar uma impressão desse formato, colecionamos as características principais, dividido em categorias.

Exemplos de temas que podem ser abordados:

-Matrimônio gay

-A guerra na Síria

- O debate de sexismo na Alemanha

- Causas de vícios

-Produção de roupas em países subdesenvolvidos


Jeito do apresentador: Ele se mantém formal, não exibe a própria opinião, senão dirige a conversa de forma investigativa. Ás vezes, serve também para esquentar ou esfriar o clima.

Ambiente: É simples, sem efeitos, e existem regras sobre a fala (por exemplo, uma duração máxima da fala por pessoa, etc.).

Horário de transmissão: Começa entre 21h45min e 23h05min da noite.

Objetivo: Oficialmente, a meta é distribuir informações ao público e inspirá-lo a se formar opiniões sobre temas relevantes. Crítica:

Sem dúvidas, os talk shows políticos também dão oportunidade aos políticos se apresentarem e aumentarem a sua popularidade, em vez de criar um verdadeiro debate. Shows e apresentadores mais populares: Os apresentadores são jornalistas famosos, de boa reputação. Os seus talk shows normalmente levam os seus nomes, muitas vezes sem adições. Exemplos são Anne Will, Günther Jauch e Sandra Maischberger. Todos trabalham na ARD.








Referências bibliográficas

MAURICIO DA SILVA, Fernanda. Apontamentos para uma história cultural dos talk shows brasileiros. Em questão, Porto Alegre, v. 16, n. 2, p. 119 – 133, jul./dez. 2010.

MAURICIO DA SILVA, Fernanda. Talk show: um gênero televisivo entre o jornalismo e o entretenimento. E-compós, Brasília, v. 12, n.1, jan./abr. 2009.

MARTINS DO ROSÁRIO, Nísia. Do talk show ao televisivo: mais espetáculo, menos informação. Em questão, v. 14, , n.2, 2008.

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