Três instantâneos do domingo



Publicado originalmente no site: http://www1.folha.uol.com.br/colunas/mauriciostycer

Domingo, 17 de novembro de 2013, 03h00

Maurício Stycer




A noite de domingo é uma das faixas horárias de maior competição na TV aberta brasileira. Destaco três instantâneos da última semana (10), que dão uma ideia a respeito das armas --sensacionalismo, engano, constrangimento, mau gosto e baixaria-- utilizadas para a conquista do público.

Na Record, o "Domingo Espetacular" (10 pontos no Ibope; cada ponto equivale a 62 mil domicílios na Grande São Paulo) explorou o caso do "rei do camarote", o tal Alexander de Almeida, que apareceu na "Veja São Paulo" contando que gasta até R$ 50 mil numa noitada. Com quatro repórteres (um em Portugal), ao longo de 25 minutos, o programa se propôs a mostrar "o que é verdade e o que é farsa nesta história".

A certa altura, em tom grave, a reportagem destacou que um site, chamado N.E.D., havia publicado um texto intitulado "Fim da farsa", no qual garantia que Alexander seria, na verdade, "um estudante de direito de 26 anos que mora com os pais".

Uma visita ao N.E.D., mantido por advogados e estudantes de direito, mostra que muitos textos, como o citado pela Record, são publicados sob a rubrica "embuste", dedicada a "notícias que até poderiam ser verdadeiras, mas não são". O espectador, porém, não foi avisado disso.

Na Band, o "Pânico" (5 pontos no Ibope), entre os muitos assuntos que tratou, dedicou 11 minutos para a polêmica das biografias. No aeroporto de Congonhas, em São Paulo, o repórter Rodrigo Vesgo tentou entrevistar Caetano Veloso e Gilberto Gil.

Abordados em momentos diferentes, ambos deixaram claro de imediato que não queriam falar. Vesgo insistiu com Caetano, enquanto ele andava pelo aeroporto, por 90 segundos. "Eu falo sobre o assunto nas minhas colunas no jornal. Não quero ficar falando pra criar confusão", disse o músico. "Não quis falar, se esquivou, não respondeu nenhuma pergunta", concluiu Vesgo.

Com Gil, apresentado como "Rei do Acarajé", o assédio foi mais longo. Por cinco intermináveis minutos, Vesgo perseguiu o músico pelo aeroporto, sem arrancar uma única palavra dele. Alguns trechos do que o repórter disse: "Tá censurando as próprias respostas, Gil? Se você ficar calado, vai ser pior, Gil. Se você quiser continuar calado, é ruim. Você não é uma pessoa pública? Infelizmente, Gil, muito obrigado por sua entrevista maravilhosa. Tá igual os livros que você quer proibir".

Já o "Fantástico" (17 pontos no Ibope) fez alarde sobre a entrevista com a mulher que filmou o cantor Justin Bieber em uma cama, dormindo, durante a sua visita ao Brasil.

A conversa com Tati Neves durou cerca de dois minutos, em uma reportagem de sete. "Das tantas mulheres que passaram pela mansão alugada, uma ganhou 15 segundos de fama com um vídeo", diz a repórter, ampliando e dando relevância a esse tempo de fama.

Um trechinho do diálogo: "E agora a pergunta que milhões de fãs querem saber: o que você estava fazendo lá dentro?". Tati: "Eu dormi lá e acordei. Ele estava dormindo e eu falando com uma amiga". Fantástico: "Você tinha dormido com o Justin Bieber?". Tati: "Sim". Fantástico: "Rolou ou não rolou?". Tati: "Se ele disse que não, eu vou afirmar que não". Fantástico: "Nem um beijinho? Beijou o Justin Bieber?". Tati:" O que você acha, se eu estava dormindo com ele no quarto, só eu e ele?".

Para quem ficou diante da TV, um domingo interminável.

Comentários

  1. O Pânico na TV também fez uma reportagem com essa Tati que dormiu com Justin Bieber, na parte daquele Poderoso Castiga. Ele ficou perguntando, de forma totalmente despudorada, o que eles haviam feito, quais tinham sido as posições, e até quanto custou o suposto programa. Essa Tati tava claramente desconfortável e não respondia nada, e o Poderoso Castiga respondeu em certo momento dizendo que "queria dar um chute nela". Tanto o Pânico na TV como o Fantástico se aproveitaram da vontade das pessoas de aparecerem na tv e terem seus 15 minutos de fama para fazer audiência, colocando essa Tati em uma situação muitas vezes desconfortável em rede nacional, dependendo da pergunta e da forma com que ela foi feita. Obviamente ela estava ali por que quis, mas vendo o teor das perguntas no Pânico na TV, ela não estava esperando que aquilo fosse conduzido da forma que foi. Ainda tem a questão da edição do programa Pânico, com cortes e sons que ajudam a humilhar a pessoa. Não vi a reportagem do Fantástico, mas acho que a diferença entre ambos nesse caso foi o grau em que a conversa chegou, mas a forma para se arrancar audiência foi a mesma.

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