Atração da Globo trata mulheres como 'burras', dizem feministas



Publicado originalmente no site: http://noticiasdatv.uol.com.br/noticia/televisao

Sábado, 08 de março de 2014, 07h22

Paulo Pacheco




Criado para mostrar que mulher também entende futebol, o quadro Bolsa Redonda, exibido dentro do Esporte Espetacular, da Globo, tem recebido críticas de homens e mulheres fãs do esporte. Para feministas, a mesa-redonda tem elementos machistas e trata as mulheres como "burras".

Veiculado quinzenalmente desde 10 de novembro de 2013, Bolsa Redonda faz uma releitura das tradicionais mesas-redondas esportivas, porém com quatro mulheres. Integram o elenco as jornalistas Glenda Kozlowski e Fernanda Gentil, a atriz Christine Fernandes e a escritora Thalita Rebouças, que assumidamente não entende nada de futebol.

Algumas atuações chegam a ser constrangedoras. Na edição de 16 de fevereiro, Thalita comentou que leu sobre a contratação de um volante de base pelo Flamengo. Além de comparar a posição do jogador com um volante de carro, a escritora fez piada remetendo ao universo feminino: "Esse negócio de base é um jogador metrossexual que usa base para tapar os poros?", brincou. Depois, Fernanda Gentil explicou que volante de base é um atleta jovem, das categorias de base do clube.

Na opinião da professora da UFC (Universidade Federal do Ceará) Lola Aronovich, a participante que faz perguntas óbvias para homens mantém o senso comum (e machista) de que as mulheres não sabem nada de futebol.

"A ideia de ter uma mulher que não entende nada de futebol parece atender a dois propósitos: o de tentar atrair telespectadores também ignorantes no assunto e o de fazer que espectadores riam da 'burrice' feminina", afirma Lola Aronovich, autora do blog feminista Escreva Lola Escreva.

"O quadro utiliza-se de muitos clichês de gênero e, apesar de ter uma proposta que defende ser inclusiva da mulher no meio esportivo, acaba se tornando mais uma forma de chacota e discriminação a elas", afirma Mariane da Silva Pisani, doutoranda em Antropologia Social pela USP (Universidade de São Paulo) e integrante do Instituto de Estudos de Gênero da UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina).

Estereótipos

O estereótipo feminino aparece logo na abertura. O nome Bolsa Redonda remete a um acessório feminino. Na vinheta, mulheres aparecem de salto alto carregando sacolas de compras. Em seguida, o cenário verde do Esporte Espetacular dá lugar a um ambiente cor-de-rosa.

"O nome do quadro já é uma estupidez, Bolsa Redonda. Não faz nenhum sentido. A abertura com figuras de salto alto e sacolas de compras remete a qualquer coisa, menos a esportes. Lembra a abertura de programas como Mulheres Ricas [da Band] ou de qualquer programa que se guia por estereótipos como moda, maquiagem, cabelo, consumismo, futilidades, fofocas", opina Lola Aronovich.

"Mesmo que as mulheres passem a compreender de fato o esporte, espera-se que elas continuem se colocando no seu lugar de mulher, sendo bonitas, femininas, um tanto burrinhas e ingênuas e que estejam em campo para dar um "colorido diferente, com luzes cor-de-rosa, batom, salto alto e bolsa", analisa Mariane da Silva Pisani.

No último domingo (2), durante uma homenagem ao ex-jogador Zico, o quadro foi bombardeado por críticas de homens e mulheres nas redes sociais. No papo, elas perguntaram ao ex-camisa 10 do Flamengo e da seleção brasileira sobre casamento, marias-chuteiras (mulheres que se relacionam com jogadores) e "romantismo" no futebol.

"Eu me sinto ofendida por um programa desse. Isso não me representa", escreveu Michelle Gomes no Twitter.

"Acho legal esse Bolsa Redonda da Globo que trata as mulheres como retardadas", ironizou Fernando de Santis.

Outro lado

A Globo defende que "a irreverência do quadro Bolsa Redonda nada tem a ver com machismo. Ao contrário, estimula e aumenta a interação da mulher com o esporte de uma maneira geral".

Segundo a emissora, mostrar mulheres que não entendem futebol faz parte do formato do quadro. "No Bolsa Redonda, temos quatro mulheres diferentes com liberdade de opinião, três que entendem muito de futebol e uma que não entende absolutamente nada. Essa interação reflete o público feminino", diz.

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