Inspirada em ‘Sex and the city’, ‘Sexo e as negas’ narra as desventuras amorosas de quatro amigas


Novo projeto de Miguel Falabella troca Nova York pela Cidade Alta, em Cordovil, Zona Norte do Rio


Publicado originalmente no site: http://oglobo.globo.com/cultura/revista-da-tv

Domingo, 07 de setembro de 2014, 07h00

Thaís Britto




Elas não bebem Cosmopolitan, mas uma cervejinha no boteco da esquina; não andam de táxi amarelo nova-iorquino, mas no carrinho barato comprado com esforço e dividido entre as quatro amigas; não vestem os estilistas mais badalados do mundo, mas reservam uma graninha para se produzir com cuidado. Uma coisa, no entanto, as moças de “Sexo e as negas” têm em comum com as musas inspiradoras de “Sex and the city”: estão em busca de um amor para chamar de seu. E, enquanto ele não chega, elas se divertem. E como! Na série de Miguel Falabella, que estreia dia 16 depois de “Tapas & beijos”, o universo das protagonistas é a Cidade Alta, em Cordovil, Zona Norte do Rio de Janeiro. Um lugar que o autor frequenta e conhece bem.

— A ideia nasceu em Cordovil, numa feijoada na casa da Nieta, minha camareira. Eu vou muito lá, sou muito bem recebido. Eu estava tão feliz, era um dia tão feliz... E eu vi umas negras lindas, tão transadas, bem vestidas. Falei, brincando: “Eu devia fazer uma paródia de ‘Sex and the city’ chamada ‘Sexo e ar nega’”, bem com esse sotaque puxado. Todo mundo começou a rir, mas eu fiquei com aquilo na cabeça. Como não jogo nada fora, guardei a ideia para o futuro — conta Falabella.

Elas não bebem Cosmopolitan, mas uma cervejinha no boteco da esquina; não andam de táxi amarelo nova-iorquino, mas no carrinho barato comprado com esforço e dividido entre as quatro amigas; não vestem os estilistas mais badalados do mundo, mas reservam uma graninha para se produzir com cuidado. Uma coisa, no entanto, as moças de “Sexo e as negas” têm em comum com as musas inspiradoras de “Sex and the city”: estão em busca de um amor para chamar de seu. E, enquanto ele não chega, elas se divertem. E como! Na série de Miguel Falabella, que estreia dia 16 depois de “Tapas & beijos”, o universo das protagonistas é a Cidade Alta, em Cordovil, Zona Norte do Rio de Janeiro. Um lugar que o autor frequenta e conhece bem.

— A ideia nasceu em Cordovil, numa feijoada na casa da Nieta, minha camareira. Eu vou muito lá, sou muito bem recebido. Eu estava tão feliz, era um dia tão feliz... E eu vi umas negras lindas, tão transadas, bem vestidas. Falei, brincando: “Eu devia fazer uma paródia de ‘Sex and the city’ chamada ‘Sexo e ar nega’”, bem com esse sotaque puxado. Todo mundo começou a rir, mas eu fiquei com aquilo na cabeça. Como não jogo nada fora, guardei a ideia para o futuro — conta Falabella.

As quatro amigas ao lado de Jesuína (Claudia Jimenez) - / TV Globo/Renato Rocha Miranda


Tilde (Corina Sabbas), Zulma (Karin Hils), Lia (Lilian Valeska) e Soraia (Maria Bia) são as quatro amigas inseparáveis que batem ponto no bar de Jesuína (Claudia Jimenez), a narradora da história. Apesar da relação com a série americana não ser direta, elas têm personalidades um tanto familiares: Soraia tem um quê de Samantha (papel de Kim Catrall), aquela que pega geral, a devoradora de homens. Já Tilde é a romântica, que sonha tanto com o príncipe encantado que já tem o enxoval de casamento pronto, só esperando o felizardo aparecer. Lia é um pouco mais velha: aos 38 anos tem uma filha de 21 e uma neta de 8, e vive às voltas com o ex-marido contraventor. Zulma é liberada, trabalha com teatro, mas precisa lidar com o temperamento um tanto repressor do pai.

Como se vê, a cultura brasileira e as pesquisas de equipe e elenco com as mulheres da Cidade Alta influenciaram na composição das personagens. As expressões mais usadas pelas quatro protagonistas para descrever as mulheres que elas interpretam na série, aliás, passam pela autoestima e a falta de frescura. Corina e Maria, as duas não-cariocas do grupo, definem a impressão que tiveram durante o laboratório na comunidade:

— Apesar de ser de Brasília, a minha família é toda carioca e do subúrbio. Então o que eu vi ali na Cidade Alta era a minha experiência no Rio desde criança: sentar na praça, conversar com as amigas, paquerar os garotos, ouvir um pagode, fazer um churrasco. É tudo muito para cima. É uma alegria que chega a ser palpável — explica Corina.

Maria Bia diz que se identifica com as mulheres da Cidade Alta por também ser negra e de periferia — ela cresceu em Taguatinga, também em Brasília. Além da vaidade, ela destaca outra característica:

— E com elas não tem mimimi, né? Teve uma menina com quem eu conversei, e comentei: “Ah, você estuda longe e o transporte é difícil, né?”. Aí ela respondeu: “É, mas vale a pena!”. Pronto, já jogou para cima! Não tem essa de ficar reclamando. Elas não se vitimizam. E as nossas personagens também são assim. Não tem tempo ruim para elas!

SEXUALIDADE FEMININA EM DISCUSSÃO

E se, há mais de 10 anos, a exibição de “Sex and the city” quebrou padrões ao tratar da sexualidade feminina sem machismos e livre de preconceitos, “Sexo e as negas” vai trazer a discussão para o Brasil. De forma um pouco mais modesta, é claro.

— Vou fazer dentro das possibilidades da TV aberta, né? Embora seja às onze da noite, temos restrições que a TV a cabo não tem. Tenho que fazer ginástica para tratar de alguns temas — conta Falabella.

Mas as intérpretes estão animadas e dizem que às vezes se pegam, elas mesmas, encarando os tabus da sociedade em que cresceram.

— Eu estou fazendo um trabalho de atriz para poder olhar tudo isso sem julgar, sem preconceito, simplesmente me entregando e defendendo minha personagem e essa história. Porque ela é real e linda — admite Karin. — Acho que a série vem para dar um pontapé nessa visão machista que se tem das mulheres. De achar que a gente tem que sentar no bar e só falar de vestidos e sapatos. Essas mulheres perguntam mesmo se a amiga deu hoje, como foi, se o cara a fez gozar, se foi bom... Falam de todos os assuntos. E são mães, são avós, são guerreiras, e tem suas dificuldades amorosas, porque mulher é mulher em qualquer lugar, em Nova York ou na Cidade Alta.

As quatro se mostram um tanto apreensivas com um possível pudor por parte do público, mas acreditam que é importante abordar o assunto.

— Eu sinceramente espero que as pessoas não fiquem chocadas com uma coisa que faz parte do cotidiano de todo mundo. Mas ninguém fala sobre sexo, né? Parece até que ninguém faz... A gente quer, na série, falar da vida com liberdade e sem preconceito. E isso é tudo muito podado, desde que a gente é pequeno — reclama Lilian.


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Mas elas riem lembrando que, às vezes, até se surpreendem aos receberem os roteiros com as cenas das personagens.

— Outro dia veio um em que a Zulma dizia: “Você não me comeu, quem te comeu fui eu. Quem tem a boca sou eu”. Não consegui nem falar isso direito (risos). Até perguntei para um rapaz que eu ficava: “Você acredita que eu vou falar isso na série?”. E ele me disse: “Mas eu já ouvi muito isso!”. E eu fiquei chocada! Perguntei: “É sério que as mulheres falam isso?”. Bom, então vamos lá trabalhar para introjetar isso aí! — diverte-se Karin.

Maria Bia diz que as cenas de sexo, é claro, são feitas com muito cuidado pela diretora Cininha de Paula. E entrega alguns detalhes:

— A gente vai homenagear grandes cenas de sexo do cinema! Claro que vai ter muita coisa nova, mas vai ter referência também.

Cada episódio de “Sexo e as negas” terá um tema como base. A estreia, sobre mobilidade, começa com Jesuína contando como foi sua chegada à Cidade Alta, a partir das remoções do Morro do Pinto — o ponto de partida para um problema crônico de transporte na cidade do Rio. Mas o assunto terá outras ramificações na história: se a mobilidade é ruim, você acaba conhecendo todos os homens da redondeza e limitando sua vida amorosa... As moças então juntam um dinheiro e decidem comprar um carro para badalar com mais liberdade.

Entre os temas estão cabelos (“Toda mulher sofre com duas coisas: homem e cabelo. São nossos dois maiores problemas”, diz Karin), desapego e preconceito. Tem coisa séria e tem humor. Tudo misturado.

—É uma série bem-humorada, mas a gente toca em questões importantes que devem ser discutidas. Fala-se em preconceito não só racial, mas social também, a que as pessoas são submetidas diariamente. Com a diferença que falamos com humor, para que chegue no espectador de forma lúdica. Porque acho que é assim que transformamos as pessoas. É interessante ter mais uma série negra na televisão — opina Falabella.

O quarteto concorda:

— É muito legal uma menina negra olhar e pensar: “Elas chegaram lá, eu também posso ser protagonista”. É uma referência que quase nunca se vê na TV. De que pode usar cabelo black, que crespo é bonito, que não precisa alisar, e que pode estar na TV assim. Elas querem se ver, se identificar — defende Maria Bia.

HABILIDADES MUSICAIS NA TELA

Rostos basicamente desconhecidos do público da TV — à exceção de Karin, que esteve em “Aquele beijo” (2011), “Pé na cova”, e fez parte do grupo Rouge — as quatro são atrizes experientes no teatro musical e “cantoras excepcionais”, nas palavras de Falabella. Para aproveitar esse talento das moças, o autor não apenas as colocou para cantar a música-tema da série, mas ainda incluiu um clipe musical no fim de cada episódio, com uma canção que versa sobre o assunto da noite.

Se no intervalo entre entrevista e fotos para a Revista da TV elas já soltam a voz, dá para imaginar que o set de “Sexo e as negas” é bem musical. As quatro fazem questão de se definir como cantoras antes de qualquer coisa, mas dizem que a experiência na TV está sendo enriquecedora.

O quarteto já se conhecia de longa data: Maria, Corina e Karin já estiveram juntas em alguns musicais. Inclusive, em “Hairspray”, do próprio Falabella, interpretavam as Dinamites, um trio de cantoras negras inspirado nas Marvelettes. Lilian, que fez parte do trio musical Sublimes, nos anos 1990, nunca chegou a trabalhar com as outras mas, como diz Corina, “no meio do teatro musical todo mundo se conhece”.

— E eu ainda ganho fama por causa de Karin Hils, né? As pessoas vêm dizer: “Nossa, te vi no ‘Hair’, você estava ótima!”. Mas quem fez foi ela... Agora que vamos aparecer juntas, acho que vão perceber, né? — brinca Lilian.

O clima de amizade que liga Soraia, Zulma, Tilde e Lia têm transbordado da tela, segundo elas. As quatro vivem saindo juntas e até criaram um grupo no Whatsapp para se comunicarem com mais facilidade. É essa relação de amizade, aliás, a maior semelhança entre “Sexo e as negas” e “Sex and the city” para elas. Embora Karin e Lilian não tenham assistido à produção americana, Maria e Corina fazem parte do time de devotas de Carrie e cia. Mas juram que não têm aquela clássica mania das fãs da série de se identificar com uma personagem específica.

Tenho um pouco de cada uma: um lado romântico, mas ao mesmo tempo uma porção Samantha, de ver um cara que gostei e ir atrás — define Corina.

Maria faz coro:

— Eu me identifico com as quatro, acho que toda mulher é isso, várias em uma. Tem dias que a gente está mais periguete, tem dias que está mais romanticazinha... — brinca.

Comentários

  1. Felizmente, dentro de uma emissora como a Globo, vem aumentando o espaço dxs artistas negrxs na programação, vide a novela "Geração Brasil", que possui um elenco considerável sem segregá-los em núcleos distantes do principal (quanto ao conteúdo das relações que se estabelecem, já não tenho conhecimento para falar).
    Não é nova a proposta de série em que o foco são personagens femininas negras (lembremos de "Antônia" e "Subúrbia"), mas já é de se entusiasmar com as possibilidades que a produção está propondo com este programa mais satírico, falando sobre mulher existindo no corpo social (sentindo, lutando, vivendo), através de um grupo que ainda é mais segregado socialmente. Espero que não entre em estereótipos e acabe perdendo a potência que pode ter. Ficamos no aguardo.

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