Hollywood que se cuide


COM MILHÕES DE ASSINANTES DE TV A CABO ENTRANDO NO MERCADO TODOS OS ANOS E UMA COTA PARA O CONTEÚDO NACIONAL, AS PRODUTORAS DE AUDIOVISUAL VIVEM UMA FASE INÉDITA. SOBRA DINHEIRO PARA A CRIAÇÃO – E FALTA GENTE PARA TRABALHAR


Publicado originalmente no site: http://epocanegocios.globo.com/Informacao

Sexta-feira, 7 de junho de 2013

Robson Viturino


Este é o trecho de uma das reportagens da edição de junho de Época NEGÓCIOS.


Há cerca de um ano e meio, a programação no horário nobre da TV a cabo no Brasil começou a mudar de cara. Ao lado das séries importadas dos Estados Unidos, começaram a surgir na tela produções brasileiras de diversos gêneros e níveis de qualidade. Neste período, surgiram minisséries soturnas como Contos do Edgar, inspirada em histórias do escritor americano Edgar Allan Poe, e a novelesca Três Teresas, que explora os conflitos de três mulheres de gerações diferentes que dividem a mesma casa. Nos canais infantis, entraram na grade programas que mesclam fantasia e história, como A Família Imperial. Há, ainda, séries sobre crimes não solucionados e mochileiros registrando as dificuldades da vida de estudante.

A criação de programas tão diferentes e a sua entrada no horário mais disputado das emissoras são sinais de um novo e bem-vindo salto de criatividade da produção audiovisual brasileira. Na base dessa movimentação, há o número crescente de novos assinantes de TV a cabo. Depois de estacionar por muitos anos na casa dos 4 milhões de domicílios, de 2006 em diante o volume de assinantes saltou para 16,7 milhões. Dentro de três anos, a expectativa é que o serviço alcance 25 milhões. Trata-se de um público formado por membros da nova classe média habituados a programas falados em português (no original ou dublados). Será, portanto, um prato cheio para os produtores nacionais.

O crescimento do mercado consumidor não explica tudo, porém. O bom momento dessa indústria se deve em grande parte a uma lei federal. Em setembro de 2011, a presidente Dilma Rousseff sancionou uma nova – e discutível – reserva de mercado. Segundo a nova lei, vinda à luz após quatro anos de gestação no Congresso, os canais da TV fechada devem destinar uma parcela de sua programação no horário nobre à programação nacional – atualmente, três horas e meia por semana. Em paralelo, fundos setoriais como o da Agência Nacional do Cinema (Ancine) e da Rio Filmes estabeleceram uma rica fonte de recursos para investir nas produções locais. Só o fundo da Ancine dispõe de R$ 800 milhões para investir este ano. Nos próximos três anos, serão R$ 3 bilhões.

De uma hora para a outra, produtoras independentes de vários tamanhos e partes do país se viram diante de um novo público, intermediadores obrigados a transmitir seu produto e dinheiro para financiar suas obras. Nada mal, hein? Dá até para sonhar com um caminho como o do mercado americano, em que praticamente todos os domicílios com TV têm serviço por assinatura. Para chegar lá, no entanto, há desafios de toda sorte. “Temos um cenário em que há excesso de recursos e de procura por projetos, mas faltam profissionais gabaritados, ideias estruturadas como planos de negócios e processos claros de trabalho”, afirma Mauro Garcia, presidente da Associação Brasileira de Produtoras Independentes de Televisão (ABPITV).

Riscos e oportunidades

Com uma bolada à disposição e a garantia de espaço na TV fechada, as produtoras têm uma oportunidade inédita de ganhar mercado. No entanto, a Lei da TV Paga, como toda medida protecionista, tem um risco altamente pernicioso. Como já vimos diversas vezes, o fomento a uma indústria nacional pode criar uma massa de empreendedores café com leite – sem o ímpeto, imprescindível no capitalismo globalizado, de brigar de igual para igual com os melhores do mundo. Com a Lei da Informática de 1984, por exemplo, buscava-se incentivar a tímida indústria local proibindo a importação de eletrônicos. Oito anos mais tarde, o Brasil estava longe de ser uma potência na área, mas acabou criando uma mão de obra que se mostraria importante para futuros negócios. Essa lógica desenvolvimentista é antiga e já foi a bandeira de diversos governos. Ela está por trás de boa parte da política do BNDES de turbinar empresas nacionais e da determinação do governo federal de que a Petrobras priorize equipamentos feitos no Brasil nas suas compras.

Ao que tudo indica, neste caso não existe o risco de criar uma Cuba do audiovisual. As produtoras há mais tempo no mercado, a exemplo da O2 Filmes, Mixer e Conspiração, são veteranas da publicidade, onde a queda de braço é intensa e os brasileiros são talentos reconhecidos internacionalmente. Em boa parte dessas empresas, mais da metade das receitas vem da produção de campanhas publicitárias para a TV. Agora, diante das novas regras da TV fechada, elas terão a chance de usar sua experiência em um setor bastante competitivo para consolidar a produção audiovisual e fazer dela uma nova fonte de receitas.

Na O2, produtora de São Paulo que tem como sócio o cineasta e publicitário Fernando Meirelles, autor de Cidade de Deus, essa mudança já está em curso. No último ano, as receitas oriundas de séries para a TV responderam por 35% do total. Em 2011, a fatia era de 30%. “A previsão para 2013 é chegar aos 40%”, diz Andréa Barata, produtora executiva da O2. Os resultados financeiros são o reflexo de uma forte mudança no portfólio da empresa. De acordo com Andréa, nos 20 anos anteriores ao início da nova lei, a O2 fez cinco produções para a TV. “No último ano e meio, nós fizemos sete séries.”

Comentários

  1. O texto é bastante pretensioso. Acredito que essa disputa direta entre a TV paga e o Cinema não existe. São estruturas completamente diferentes, apesar de usarem o mesmo recurso material. Não há essa concorrência acirrada. Quem é fã de Hollywood também pode ser fã do Universal Channel. Uma coisa não anula a outra, então ambos se complementam. E é ainda mais pretensioso Robson Viturino dizer que "com apenas um ano" essa lei fez uma enorme diferença. O que eu vejo é um cenário totalmente contrário ao que essa matéria fala: tem um grande número de profissionais capacitados que não conseguem nem uma brecha para participar dessas novas produções, porque o dinheiro se concentrou em sua maioria na mão dessas enormes produtoras que, visando APENAS o lucro, terceirizam todo o projeto resultando na contratação de qualquer pessoa que queira trabalhar e receber uma miséria, algo que profissionais capacitados não querem receber, afinal, eles estudaram e se especializaram para ganhar mais e não para ficar refém de um sistema vicioso que existe dentro dessas gigantes produtoras. Esse edital da ANCINE é um exemplo da distribuição da renda (http://www.ancine.gov.br/sites/default/files/ATA%20DA%20COMISS%C3%83O%20PAR%202012%20-%20HABILITA%C3%87%C3%83O.pdf) só a O2 e a Conspiração garantiram um adicional de renda para dois longa-metragens de cada uma. E isso é um adicional de renda, então é possível inferir que eles já tinham uma certa quantidade de dinheiro pra realizar o projeto.
    O texto foi coerente ao fazer uma comparação com outras medidas do governo que foram desastrosas, mas isso poderia ser facilmente evitado com uma fiscalização assídua. Por exemplo, se a ANCINE garante tantos mil para essas produtoras já consolidadas ela deveria fiscalizar se eles realmente estão fazendo o trabalho ou se estão terceirizando o serviço. Acho válido também a criação de um edital que visa somente as pequenas produtoras, como o objetivo de proporcionar o crescimento para garantir uma disputa igualitária com essas empresas já consagradas. Tentar fazer a lei como uma vilã, uma vez que ela pode resultar em acúmulo de renda também não é o ideal, o ideal é garantir que ela funcione da maneira como foi planejada para funcionar.

    Valeu!

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