Seminário I: Reality Show



Universidade Federal Fluminense
Instituto de Artes e Comunicação Social
Cinema e Audiovisual
Professor: Felipe Muanis
Alunos: Anajúlia Rangel, Nelson Teodoro e Wilson Antonio




“Umberto Eco, em seu texto “Tevê: a transparência perdida”, afirma que a televisão criou uma ilusão da realidade, transformando-se de um veiculo de fatos em um aparato para produção dos fatos. Logo, a televisão passa a ser uma produtora da realidade. Muitas e das mais diversificadas são as definições do que seria um reality show; Winifred Fordham Metz, em seu ensaio "Como funcionam os reality shows?", define o formato como programas que, em essência, não empregam atores nem roteiro, concentrando-se em imagens de eventos ou situações reais, teoricamente, dependendo que as câmeras capturem tudo tal como acontecem.

Os reality shows têm suas origens remotas nos programas de jogos do rádio e nos programas de calouros, e passaram pelos programas que usam câmeras ocultas e por séries em estilo documentário. "Esta É Sua Vida" (final dos anos 40) é apenas um exemplo de programa de rádio que mostrava a história real da vida de uma pessoa, dependendo da participação de pessoas reais gravadas na presença de uma audiência. No começo dos anos 50 o programa faria a transição para a televisão.

Se o cinema já mostrava, desde de seus primórdios, imenso interesse em documentar recortes da vida e do cotidiano de "pessoas comuns" (não-atores); trazendo obras emblemáticas como "Nanook, O Esquimó" (França/Estados Unidos, 1922), que já levantavam a questão da real veracidade (ou não) do que estaria sendo documentado pelas câmeras; a TV por muitos anos associaria os eventos ou situações reais ao formato telejornal, dedicando situações ficcionais às telenovelas, séries e mini-séries, entre outros.

Em 1988 entretanto, a greve de 22 semanas dos roteiristas de televisão prejudicou seriamente a programação (principalmente o conteúdo ficcional) das redes. Canais como a Fox passaram a exibir reality shows durante este conturbado período e continuaram a fazê-lo posteriormente. O mais famoso deles seria exatamente um reality que obedece ao nosso recorte de maior interesse de estudo dentro do formato ao qual aqui nos dedicamos, mostrando pessoas reais em sua prática profissional ou exercício de suas funções. Trata-se de "Cops" (1989), que acompanhava policiais de diversos locais do país, gravando suas respostas reais a chamados e ameaças.

Todavia, os reality shows televisivos começaram a tomar o formato que os popularizariam mundialmente, na década de 90, com o programa “The Real World”, da MTV, veiculado em sua primeira temporada no ano de 1992. A partir do trabalho de Mary-Ellins Bunim e Jonathan Murray, respectivamente ex-roteirista de novelas e documentarista, a emissora criou o programa, que se sustentava em situações reais que aconteciam com dez jovens de diferentes partes de Nova York confinados em um loft em Nova por três meses. "The Real Worl" foi o pioneiro em criar elementos que viriam a tornarem-se marcas registradas de programas populares no formato reality, como o chamado confessionário: sala onde os participantes poderiam, isoladamente diante de uma câmera, tecerem considerações sobre sua participação, ou de seus companheiros, nos episódios.

A partir desse programa, vários outros, na televisão americana, começaram a surgir no mesmo formato, como "Road Roles" na própria MTV, em 1995. Porém, nessa primeira fase do formato, ele era normalmente estruturado em torno de pessoas que conviviam em um “cativeiro”, onde o espectador pudesse vigiar constantemente o que acontecia com as mesmas. Talvez o exemplo mais popular desse tipo de atração televisiva seja o "Big Brother", criado em 1999 John de Mol, executivo da TV holandesa sócia da empresa Endemol, inspirado no livro "1984" de George Orwell.

A imensa popularidade do "Big Brother", exportado para diversos países, e outros programas que utilizariam variações de suas regras, podem causar a falsa impressão de que reality shows envolveriam obrigatoriamente algum tipo de competição na estruturação de seu formato; o que não é absolutamente verdade para muitos dos casos. E neste contexto, o termo realidade, como já definimos, pressuporia programas com situações não previamente roteirizadas, sendo destarte sustentadas pelos dramas pessoais e conflitos entre, ditas, "pessoas comuns”, não necessariamente adversárias no decorrer dos episódios.

A MTV Brasil foi a primeira a apresentar um reality show no país, uma filial do "Na Real" americano, o programa "20 e poucos anos" (2000), mas com pouca repercussão. Anos mais tarde, a Rede Globo veicularia para todo o Brasil a primeira versão de "No Limite" (2000), Também baseado num programa americano, o "Survivor", alcançando grandes índices de audiência. O boom brasiliro viria com a apresentação da "Casa dos Artistas" (2001), no Sistema Brasileiro de Televisão.

Aproveitando tudo o que foi afirmado acima, ressaltamos que diante de uma gigantesca audiência, os reality shows foram se reproduzindo em diversos canais, de Tv fechada e aberta, se subdividindo em diversas categorias e se apoiando em gêneros já existentes na televisão, como o documentário, drama, ficção, concurso e ate mesmo na novela.

Desta forma, o espectador se vê diante de um programa que sacia sua vontade de observar o real, de bisbilhotar a vida dos outros, quase que uma obsessão pela veracidade. Para isso, os realities que mais fazem sucesso são aqueles que se atentam ao personagem: uma busca por pessoas de personalidade forte e definida, que possam, indiretamente, “representar” o espectador. No entanto, outros tipos de realities saciam não apenas essa sede "voyeurista" de observar a vida alheia, mas também de poder entender como funciona a vida de pessoas às quais ela não possui acesso.

Entre os Realities de maior audiência na atualidade, temos exatamente aqueles que procuram mostrar a vida de pessoas que trabalham com algo interessante, exótico ou diferente, como tatuadores ("LA INk", "Miami INK", "London Ink" ou "Bad Ink"), chefs de cozinha ("Top Chef"), modelos ("American Next Top Model"), cantores ("The Voice", "The X Factor"); garimpeiros ("Gold Rush"), Mágicos ("Dynamo"), confeiteiros de bolo ("Cake Boss"), jogadores de futebol ("Joga 10"), especialistas em sobrevivência

("Man Vs Wild"); ou ainda exercendo funções pitorescas como esposas de milionários ("The Real Housewifes") ou bon-vivants endinheirados ("The A.List: New York); Também aqueles que estariam vivendo situações conflitantes, como a escolha por um vestido vestido de noiva ("Say Yes To The Dress"), ou a necessidade de emagrecer ("Kistie Alley's Big Life"), entre outros. Eventualmente, ao mesmo tempo, colocam os participantes dentro de disputas e jogos. Também, ao longo desse período, surgiram os reality-shows que exploravam a vida dos famosos, como "The Ousbornes" (2002), o mais recente "Keeping Up With the Kardashians" (2007)

O termo reality show, modernamente, poderia ser utilizado em produções especializadas em mostrar, de forma simulada, uma realidade. Utilizando-se de situações de conflito, junto à edição, efeitos de pós produção e musica, para intensificar tais situações e adicionar uma curva dramática ao programa.

Nos Reality-shows, o comportamento dos “personagens” é ambíguo, e portanto, humano. Os participantes são humanizados e os espectadores se apoderariam de um poder de “divino”. Nesta inversão está uma das formulas de sucesso do formato. Esta tensão entre o desejo de se expor e a necessidade de se proteger pode ser um dos atrativos desse tipo de programa. É algo com o qual todas as pessoas podem se identificar. (BOURDOUKAN, 2002).

O Reality Show não é uma forma fechada com características próprias e únicas, o gênero abrange diversas áreas e características (competição, costume, lifestyle, etc); no entanto, há uma série de atributos que são comuns a todos os subgêneros, como o primeiro traço - a centralidade no cotidiano, escalando sujeitos desconhecidos e superestimando o banal, experiências pessoais, hábitos profissionais. A escopofilia é intrínseca ao Reality, pois é o ser humano comum, o próprio espectador, presente na televisão, expondo física e psicologicamente suas virtudes e falhas para um observar avaliativo, que automaticamente consente, e assim partilha também os sentimentos alheios. Com essa participação o espectador deixa de ser mera audiência passiva e se transforma em quase interlocutor, em agente discursivo, já que cada vez mais interage com o programa (por telefone, SMS, twitter), de maneira a ser levado a reflexões sobre si ao acompanhar os problemas e soluções da atração televisiva.

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